Rico, mas só por um instante

Movido pela ufania ele fechou as gavetas, subiu na mesa, levantou os braços, bateu palmas, deu um soco no ar e para os colegas gritou histérico:

- Gente, estou rico! Estou rico!

O escritório parou com aquela extraordinária declaração. Enquanto isto as perguntas se acirravam de boca em boca. O vozeirão era incontrolável no local. Naquele instante muitas perguntas eram feitas.

- Que houve com ele?

- Endoideceu, cara?

- Que diabo deu nele?

Os olhares se voltaram na direção da mesa do Roberval quando todos se depararam com ele dançando sobre a mesma. Seus olhos faiscavam de alegria e miravam em todas as direções que até parecia estar zombando de todos. Era uma alegria larga, prazerosa e feliz como jamais fora visto no colega.

- Que bicho te pegou, Rob? Indagou Argemiro, um dos seus melhores colegas do escritório.

- Não enche o saco, Miro! Não vê que estou feliz? - berrou rodopiando no espelho da mesa.

- Acho que ele está muito mal! Parece louco - advertiu a colega Nanci.

Uma risada coletiva e barulhosa foi dada, eram todos a se divertirem da cena.

- Que vá tudo pro inferno! - rebateu Roberval, muito bem humorado.

- Gente, que está acontecendo aqui? - assim perguntou dom Azenon (como todos chamavam o chefe), que apareceu pasmo, e de soslaio quis se intervir na questão. Tentando amenizar a situação ele pediu silêncio. Foi pior. Ai é que o escritório virou algazarra. O chefe não tinha moral pra nada, pois ele próprio, de vez em quando, gostava de pandegar com todos. Ele se fez de autoritário na hora imprópria e teve que engolir a seco as doideiras do Roberval e companhia.

De um canto qualquer da sala surgiu uma voz berrando assim:

- Tá apaixonado, Rob? Arranjou um rabo-de-saia, foi?

Já, de um outro lado da sala, alguém zombou gritando:

- Vá ver que ela é rica e vai sustentar ele pro resto da vida.

Dom Azenon gracejou dizendo:

- A namorada do Roberval é misteriosa! Ninguém conhece.

- Creio que ele tá é duro e endoideceu! - rebateu sorridente a loirinha Nanci.

- Isso mesmo, amiga, tô duro. Duro pra cacete, mas com uma linda história de amor pra contar.

- Uma história? Que história? Em coro indagaram.

- Deixa que eu conto.

E do alto da mesa Roberval se pôs a contar. Foi o discurso mais eloquente de sua vida, onde ele dizia: - meu tataravô foi um pobretão do cacete; meu bisavô, idem; já o meu avô, coitado, nem se fala; e meu pai? Xiiii... um pé-rapado! Mas, eu não! Não nasci pra ser pobre. Ganhei a Quina. Ela é toda minha. Só minha!

Todos se levantaram de olhos esbugalhados.

- O quêêê? Você ganhou a quina? - admirados, perguntaram aos berros.

- Ô cara, você tá rico, milionário e não nos disse nada? Indagou o chefe.

- Sim! A Quina é minha! Só minha! Por ela eu lutei a vida inteira. Mas agora eu a tenho. Tô muito, muito, muito feliz. E não é pra menos. Ela é a coisa mais preciosa que me aconteceu na vida.

Nesse instante um telefone tocou e alguém gritou:

- Roberval, Roberval, seu telefone da mesa está tocando, desça logo e atenda. Pode ser alguém do banco ou, até mesmo, da TV, quem sabe? Atenda.

A oratória foi interrompida com aquele triiim, e o silêncio foi imposto para que se pudesse ouvir as palavras do agora, mais do que nunca, o admirado e respeitado milionário Roberval, que ao telefone dizia:

- Sim, sim, sou eu, o Rob! O quê? Não me diga! Hoje à noite? Tá. Tá bem! Tá combinado. Te vejo às nove sem falta. Até! beijos! Tchau!

Olhou para todos em sua volta; estalou os dedos; deu um sorriso exagerado e desligou beijando o aparelho telefônico.

- Quem era Rob? - dom Azenon quis saber.

- Vá ver que era alguém da Globo marcando uma entrevista pras nove - sentenciou Nanci.

- Você vai aparecer em que programa, Rob? - perguntou Argemiro.

- Nada disso Pessoal! Quem ligou foi a Quina! Eu não disse? Parece mesmo que ela está arriadinha por mim.

- Ela quem? - perguntaram em coro.

- Joaquina, minha nova namorada:

Eu a chamo de Quina. Ela é um amor......

***

Deram um pau no Roberval que foi parar no hospital.

José Pedreira da Cruz
Enviado por José Pedreira da Cruz em 13/11/2005
Reeditado em 24/03/2021
Código do texto: T70886
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