3 Dicas Para Escrever Contos de Suspense (inspiradas em Stephen King)

Gostemos ou não do cara, é preciso admitir: Stephen King tem seus méritos. Afinal, não é para qualquer um escrever o tanto que ele escreve, e sempre com uma criatividade afiada para entregar histórias de suspense envolventes, memoráveis e, volta e meia, hollywoodizáveis.

Recentemente, terminei a leitura de seu livro de contos 'O Bazar dos Sonhos Ruins', e foi uma experiência bem bacana. E não só pelo prazer da leitura. Aqui e ali deu para perceber alguns macetes que SK usa quando está criando uma atmosfera de suspense na história, algo certamente recompensador para um Escritor Café com Leite.

Então, sem mais delongas, vamos a 3 dicas para escrever contos de suspense inspiradas em Stephen King.

Ah, e rolam alguns exemplos abaixo, mas todos inventados. Então fique tranquilo: sem spoilers!

[Dica #1 - Adiantar um acontecimento impactante.]

A certa altura, vem uma pequena bomba. Algo do tipo:

"Ela morreu naquela tarde."

E vem assim, sem muito aviso, de surpresa mesmo.

O que importa é lançar uma informação em antecipado, mas incompleta, chocando e, por isso, despertando a curiosidade no leitor.

Na sequência, a narrativa continua como se nada demais tivesse sido dito. Os fatos vão sendo desenrolados calmamente, tranquilamente, até que, enfim, a pequena bomba aparece novamente e, agora sim, com o devido espaço para ser explorada.

Apesar desta estratégia quebrar um pouco a surpresa da revelação (como a da morte de um personagem), ela consegue servir de engajamento. O leitor passa a se perguntar como a tal personagem vai morrer, pelas mãos de quem, em quais circunstâncias, e por aí afora, numa vibe de suspense e tensão, garantindo a leitura da narrativa até seu fim.

[Dica #2 - O confidente que se torna a vítima.]

Não é um tipo de personagem inventado por Stephen King. E é até meio clichê já - você certamente consegue se lembrar dessa figura, seja de livros ou filmes. Porém, ela continua tendo sua graça e espaço nas histórias de suspense.

É aquele personagem que escuta o relato do protagonista, servindo de seu confidente, até mesmo de testemunha, até que a coisa dá ruim pro lado dele.

Uma espécie de depositário dos fatos centrais da história. Tais fatos geralmente são chocantes, surpreendentes, fantásticos, e, por isso, esse personagem-testemunha habitualmente adota um tom cético, descrente; num extremo, pode até debochar daquilo que o protagonista está lhe contando.

"Arrã, claro, o carro tem vida própria e está por aí matando pessoas."

E aí, nas últimas ações da narrativa, quem sabe no último parágrafo ou na última linha, vem a reviravolta: a testemunha subitamente descobre que tudo aquilo era verdade. E o pior: não apenas verdade, como ele, até então só o confidente, está envolvido até o pescoço e se tornou a próxima 'vítima' (é sobre quem recairá a maldição, é o próximo alvo do Mal, é aquele de quem o protagonista falava, etc).

O pequeno plot twist ao final garante ao leitor um pequeno pulo. Além disso, geralmente a história termina por aí, sem estender a revelação até suas últimas consequências, cabendo ao leitor, ao final da leitura, fazer esse raciocínio de encaixe - o que é também uma forma de suspense bem marcante.

[Dica #3 - Fatos fantásticos sem explicação.]

Essa estratégia do SK rebate uma grande paranoia dos Escritores Café Com Leite (tipo este que vos fala), a de que seria preciso explicar tudo nas nossas histórias.

Cara, não!

Aqui cabe recuperar uma das dicas mais básicas sobre narrativas, especialmente literárias:

nunca explique os acontecimentos ou fatos; demonstre-os e deixe que o leitor tire suas próprias conclusões.

Nas histórias de suspense de SK, essa máxima surge expressa em forças de antagonismo (ou simplesmente no vilão mesmo) que são o que são pelo simples fato de ser. Ou seja, é um fato fantástico sem explicação por detrás.

Não há necessidade expor o fato fantástico em suas origens, na sua razão de ser, no seu íntimo metafísico com todos os motivos, intenções, objetivos...

Deixar o fantástico como fantástico e ponto final joga as interpretações para o leitor. E isso se ele quiser interpretar alguma coisa, já que aceitar o inexplicável pode ser parte do jogo proposto pelo autor.

Porque, nesse tipo de abordagem, quando lemos uma história em que o absurdo acontece sem motivo ou fundamento (como uma verdade encrustada na ordem das coisas e só), nasce em nós a sensação perturbadora de que coisas desse tipo poderiam acontecer conosco, e a qualquer momento, justamente porque elas não tem razão de ser.

É a diferença entre você escrever uma história do Bicho Papão que se esconde debaixo da cama das crianças porque é assim que as coisas são, e escrever uma história em que o Bicho Papão é uma entidade X, que procura resolver uma questão Y, e que por isso só faz de vítima as crianças Z, daí vem o rolê de se enfiar debaixo das camas...

Não que histórias de suspense mais detalhadas não tenham espaço. A questão é notar como a versão mais enxuta de explicações pode favorecer um clima de suspense justamente através dessa ausência - e Stephen King faz isso em quase todos os seus contos.

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É isso! Espero que, assim como foi comigo, essas percepções tiradas junto do tio King te botem pensando na tua próxima história de suspense!

Até a próxima.

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