KRONAUSTINO tem o nome estranho, mas a sua missão não é só conhecida por todos nós que chegamos a esse planeta ao ser cuspido em um parto, como a recebemos. Ninguém nos disse que era uma missão, ninguém nos entregou nada por escrito. Mas sabemos que a ele foi dada a mesma que a nós. Seu nome com a letra K foi ideia do escrivão. “Com K fica melhor” disse o homem do cartório para o pai que tinha cismado com o nome. “Tudo bem, o senhor é que sabe” respondeu o roceiro com voz humilde. E essa voz humilde foi passada para o menino que acolheu o nome, a missão e tudo mais como quem ganha um doce de presente. Cresceu estudando pouco e trabalhando muito. Brincou raras vezes. Tinha apenas mínguas a se fazer naquela vila. Para ele o que a manhã lhe desenhasse, ele coloria até à tarde, e tinha a noite para se lembrar de cada contorno. Não entendia nada das notícias dadas no telejornal. Não acompanhava novelas. O sermão do padre, quando havia missa na igrejinha, também era incompreensível para ele. Quando surgiu a primeira igreja evangélica, igreja crente na linguagem do povo dali, ele foi aos cultos cinco vezes, mas também nada compreendeu. Moisés, Elias, Noé e até Abraão ele conhecia. Mas o Jesus só o padre e o pastor falaram dele, a catequista apenas tentou. O que o atraía mesmo era futebol no rádio. Imitava os narradores. Começou a narrar, com a voz enfática, tudo o que fazia na vida. Foi chamado atenção quando decidiu narrar em alto e bom som o que estava fazendo na privada depois de comer goiaba o dia inteiro. Ele era assim, nome estranho e sujeito conhecido. Tinha a missão de todo mundo ali: Viver o máximo de dias possíveis e fingir ser feliz para ninguém encher a paciência com conselhos. Ainda bem que ele só é narrador do cotidiano. Já pensou se fosse comentarista também? Escreveria crônicas e evangelizaria mais que o padre o pastor.
SÉRIE: ABECEDÁRIO DAS RELUTÂNCIAS HUMANAS
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