O nosso mundo vai ficando menor
Boa tarde meus 23 fieis leitores e demais 36 que de quando em vez aparecem aqui no meu baile literário a fim de ler crônicas dançantes. Lamento, mas hoje eu não estou para festa. O meu mundo vai ficando mais pequeno, e não falo dos avanços tecnológicos na área da comunicação, aproximando as pessoas. Falo da morte, que as separa neste plano físico no qual habitamos.
Tá, sei, morrer faz parte, é da vida - e a vida continua noutro plano -, mas tudo que é demais faz mal, ainda mais nesse tempo de pandemia que estrapola tudo aos limites. Mesmo eu sendo um cara duro na queda, de superar as coisas, de ir adiante e manter o humor. Esses dias foi o meu amigo Célio que teve um infarto e virou um alfação gigante plantado lá na UTI do hospital até não sei quando - escrevi sobre isso -, ontem foi o Tom que se matou. Tava depressivo e se matou.
O Tom é(ra) um outro camarada meu, mora(va) mais pro fim da minha rua. Eu sei que ele andou enfrentando uns perrengues há uns dois anos, ficou bem abalado, foi coisa séria, mas eu o via por agora e ele parecia normal. Faz mais de duzentos dias, desde o início da pandemia, que a gente não se encontrava pela rua para um café e uma conversa. Ele passou uma vez aqui pela frente da minha casa e parou para conversar, eu disse pra ele tomar cuidado, não facilitar com o corona e ele disse que tava se cuidando, dava risada, como era o jeito dele. Depois eu o via circulando pela rua e dava um alô, raras vezes.
Ele é(ra) um pouco mais velho que eu, tinha 59, e a gente sentava na praia para ouvir som e trovar fiado, às vezes. Ele colocava um pendrive com umas canções antigas sessentistas e setentistas e a gente escutava. Gente muito fina o Tom. Soube pelo veterinário, que veio aqui em casa vacinar o Meganha e me disse que alguém tinha se matado lá pros lados do final da minha rua. Na hora nem pensei que poderia ser ele, mas umas horas depois um outro vizinho passou aqui pela frente e me disse: "Ô Tunico, tu viu que o Tom se matou?"
Puxa vida, dois camaradas na sequência faz a gente fraquejar. Depois ainda vi que o Eddie Van Halen morreu. Puxa vida, o Eddie Van Halen, esse cara foi um ícone da minha geração, ouvir ele surgir em 1979 com aquele som de guitarra inimaginável foi algo impressionante, meu "software" mental não conseguia processar aquilo, apenas pude ficar com os sentidos maravilhados, tomados por aquilo. Puxa vida, lutou por cinco anos contra um câncer. Puxa vida, puxa vida, puxa vida, puxa vida, puxa vida, puxa vida, centenas de puxas vidas nesse momento. Puxa vida!!!!!
Agora há pouco, lendo o Dart, vi ele escrever sobre os 80 anos que o Lennon estaria completando hoje. Lembro bem da morte dele, assassinado a tiros por um maluco. Todo mundo deve se lembrar disso. Quando as pessoas das quais gostamos ou com as quais nos identificamos se vão, o nosso mundo vai ficando menor, literal e literariamente, fato. Com o Célio e o Tom, sinto meu mundo reduzindo, que eu eu estou passando. Com o Eddie, sinto que isso acontece com a minha geração, que estamos passando o bastão para quem vem.
Li noutra crônica do Dart, tempos atrás, mas não há tanto tempo assim, sobre esse lance da gente se relacionar com as gerações mais novas, das dificuldades de conversa. Ele tem razão, vai ver é isso, sinto a dificuldade de comunicação com os que estão chegando e, ao ver amigos e referências partindo, a gente se percebe como ser temporal, datado, mesmo com a vida sendo esse eterno recriar, essa constante atualização de softwere. Todavia, o hardwere vai ficando datado e começa a ter problemas de comportar as atualizações, por falta de memória disponível, coisa assim. Daí o mundo passa, a gente vai passando e as perdas funcionam como indicadores. Vai ver é isso.
Até sexta que vem, espero que ninguém mais morra ou vire vegetal até lá. A vida continua, vivamos.
----- * -----
Era isso pessoal. Toda sexta, às 17h19min, estarei aqui no RL com uma nova crônica. Abraço a todos.
Mais textos em:
http://charkycity.blogspot.com
(Não sei porque eu ainda coloco o link desse blog, eu perdi a senha e não atualizo ele há séculos. Até eu descobrir o motivo pelo qual continuo divulgando esse link, vou mantê-lo. Na dúvida, não ultrapasse, né. Acho que continuarei seguindo o conselho que a Giustina deu num comentário em 23 de outubro de 2013: "23/10/2013 00:18 - Giustina
Oi, Antônio! Como hoje não é mais aquele hoje, acredito que não estejas mais chateado... rsrrs! Quanto ao teu blog, sugiro que continues a divulgá-lo, afinal, numa dessas tu lembras tua senha... Grande abraço".).