A VISITA DOS PRESIDENTES

O ano era 1975 e ainda nem se cogitava de democracia , tampouco havia preocupação com temas como aquecimento global e ninguém falava em virada do século , terceiro milênio, muito menos superpopulação, pandemias fim do mundo ...

Já hoje me ponho a compor este texto quando estamos à iminência de inaugurar a terceira década do século XXI o que não impede que lhes diga que 1975 parece que foi logo ali ... mas não foi , tanto quanto não é ilusória nossa atual pandemia e tanto quanto nada disso vem em prejuízo do relato , afinal as histórias precisam ser contadas ....

Foi o ano em que o Brasil tinha como presidente um dos tantos Generais que foram postos no Palácio do Planalto por conta do golpe militar de 1964. O General da vez era o “alemão” Ernesto Geisel que, aliás, como bom teutônico era luterano e não escondia sua birra com os católicos e muito se diz, à meia boca, que foi graças a isso que o Brasil aprovou a Lei do Divórcio.

Mas quando o Presidente Geisel visitou as cidades de Rivera e Santana do Livramento em 1975 ainda havia no Brasil somente a possibilidade do “Desquite” – uma pessoa que se separava virava “desquitada” e isso era muito estranho para os uruguaios onde o Divórcio por iniciativa unilateral da mulher e sem necessidade de apresentar motivos vigorava desde o início do século XX.

O Presidente uruguaio era Juan Maria Bordaberry, e eles se encontraram para tratar assuntos de interesse comum aos dois países onde, certamente, redemocratização não entrava na pauta e , muito provavelmente troca de prisioneiros comunistas fosse um tema apimentado. Divórcio e Desquite devem ter sido abordados.

Ou não ...

Na nossa família , assim como nas famílias de outros brasileiros que estavam asilados no Uruguai, surgiu a novidade de um recolhimento provisório ao cárcere da Polícia uruguaia, mas somente durante o curto período da visita presidencial. Questões de segurança ....

Protocolos da ditadura deixados de lado, nós que éramos pré adolescentes , ainda sem maturidade para entender tudo o que se passava íamos “curtindo” as coisas excêntricas que cercavam a presença de dois presidentes na “fronteira da paz”.

Helicópteros sobrevoando a cidade , creio que foi uma das novidades que colocou para fora das casas boa parte da população. Contingentes militares nos dois lados da fronteira e um aparato nunca antes visto na então pacata zona fronteiriça.

No lado de Rivera a viatura policial mais moderna era um Jeep cor cinza e no lado brasileiro havia um Fusca e uma Rural da Brigada , enquanto que a Polícia Civil ostentava uma Kombi, daquelas modelo antigo com parabrisa dividido , isso tudo para demonstrar como eram precárias as coisas.

Recordo que junto com os piás do bairro ficamos numa esquina para esperar a passagem das comitivas e observávamos atentos e curiosos o avançar de motos de batedores com suas sirenes abertas , coisa que nunca havíamos visto a não ser em filmes , e um momento decisivamente inesquecível foi uma reluzente presença de uma Brasília da Polícia Rodoviária Federal – um luxo nunca visto !!

Lembro que quando terminou a visita o pai voltou para casa, mas ao invés de comentar essas coisas superficiais ele e os outros asilados trataram de outros assuntos, que para nós não pareciam tão interessantes quanto os helicópteros, as motos e a Brasília da Polícia Rodoviária....