Na praça
Na praça a vida transcorre sem pressa. Espero por um amigo que não vejo há tempos. Consulto o relógio, vejo o movimento das ruas, observo as pessoas. A praça é predominantemente feminina. Uma mãe que amamenta um bebê, um grupo de mulheres fazendo ginástica, uma mulher de meia idade correndo ao redor do banco onde sento com meu amigo que acabou de chegar. Noto que o bairro é de gente mais abastada. Tudo ali exala luxo. As casas com flores amarelas na porta, a rua arborizada, as paredes de algumas moradas de madeira. Sobretudo o silêncio. Ali posso ouvir o meu amigo e ele também a mim.
Há tempos observo que a sociedade mudou muito com a chegada das redes sociais. Se vou ao hospital, vejo um senhor idoso ouvir música na sala de espera. Se vou numa entrevista de trabalho, logo vejo um rapaz passar na porta ouvindo funk no celular. Gritos para alcançar o ônibus que passa deixando passageiros para trás, a ladainha dos vendedores no coletivo, a menina na fila do banco vendo um vídeo no Youtube. O mundo cada vez mais ruidoso.
Ali na praça não. Ali se pode sentar tranquilamente. Sem rádio de pilha com os que praticam atividade física, sem fogos de artifício, sem nada. Apenas um silêncio imperturbável. Uma paz indescritível.
Ali meu amigo e eu falamos da vida, da pandemia, de livros e aproveitamos para olhar as moças. Meu olhar se detém na jovem mãe. Um chapéu branco na cabeça, uma bermuda azul e uma camiseta branca lhe dão um ar elegante e belo. A criança no colo dão para aquela mulher um ar maduro, uma certa seriedade, sobriedade. A mim parece irresistível. Uma mulher madura corre e parece ter congelado o tempo. Tão introspectiva e segura e linda na sua roupinha de ginástica. Vejo um homem parar de carro e deixar uma mulher na porta de casa, mas logo vai embora. Tudo isso apreciamos sem necessidade de palavra alguma.
Falo do Coronavírus e dos meus medos. Meu amigo me olha nos olhos, fala de está sem cortar os cabelos há meses, sem ver os pais com tanta frequência. Posso observá-lo com calma. Posso ouvir também a mim mesmo. Falo da minha rotina, de ver o dia amanhecer e anoitecer sem ter ido sequer até a padaria, dos meses sem ver os amigos para beber alguma coisa. Tudo isso fica mais ainda mais acentuado sem aquela barulheira do centro de Belo Horizonte e do meu bairro. Os sentimentos falam mais forte, as dores e as alegrias ficam mais evidentes. Ali me sinto presenteado, feliz, pensando em todos aqueles que não dispõe de momentos consigo em meio ao alarido ensurdecedor do dia.