Imagem: arquivo pessoal 



JOSEMAR DO BRASIL

Andando pela rua, dou de cara com a cena: um catador, sob o sol escaldante, puxa com visível esforço sua carroça de “catados”. Mas o que me invade os olhos não são as caixas de papelão, vasilhames de pet e chapas de metal, tudo bem organizado entre as grades de ferro do “veículo” de duas rodas. O que me chama a atenção são dois detalhes surpreendentes: a boneca quase do tamanho de uma criança, bem amarradinha na parte dianteira, e uma esvoaçante bandeira do Brasil.

Irresistível. Paro esse brasileiro patriota que me cai pela frente, assim de repente, e puxo uma conversinha. Pergunto como é seu nome. De pronto, ele me diz se chamar Josemar. Digo que a boneca do carrinho é muito bonita e pergunto se foi achada em algum descarte. Ele sorri de leve, faz um carinho no rostinho da boneca e explica:

— Não, essa é a Jéssica, minha boneca da sorte!

— Boneca da sorte? pergunto, um tanto intrigada.

— Sim! — ele responde — é a boneca da Marcely, minha menina. Ela me deu para enfeitar a carroça e dar sorte na “catação”.

— E Jéssica tem lhe dado sorte? — quero saber.

— Dá! Dá muita sorte! — o rosto dele se ilumina— Imagina a senhora que não é nem nove horas, — se bem que eu saí de madrugada, né? Mas a carroça já tá o maior peso! Tô nem dando conta de puxar mais!

E a bandeira do Brasil? Ah, a bandeira, ele diz, quem lhe deu foi o Jogador Gilberto Silva, que é aqui da cidade! Não anda sem ela! Alisa o pano verde-amarelo com um orgulho que lhe inunda os olhos, e me deixa com um nó no peito. Ah, Brasil! Esses seus filhos fieis!

Peço permissão para fotografá-lo ao lado de suas relíquias. Sem conter a alegria, ele diz  prontamente que sim. Com a mão, dá uma ajeitadinha nos cabelos rebeldes de Jéssica e uma esticadinha básica na bandeira: quer que seus tesouros fiquem bem na fita — ou nos cliques!

Fotos prontas, ele pergunta se pode mandar uns recados. Creio que pensa estar em alguma reportagem. Digo que sim e gravo suas falas. Ele manda um alô para a filha, dizendo que Jéssica está ali com ele; o outro alô é para Gilberto Silva — nesse ponto, a voz embargada, agradecendo e dizendo que sente muita falta do “campeão”.

Agradeço e encerro a “reportagem”. Depois do inusitado encontro, vou pra casa pensando na vida. O catador some na esquina puxando seus tesouros: a carroça, a boneca Jéssica e a Bandeira do Brasil. Hoje, Josemar do Brasil não me vai me deixar em paz...