SABOR BRASILEIRO
Gilberto Freyre, em “Casa Grande e Senzala”, disseca, magistralmente, tanto as profundezas quanto as faces mais sutis da formação cultural brasileira, no período patriarcal, sob o alicerce da escravidão negra e o concurso do indígena.
Nesse precioso trabalho, nos deixou frases antológicas que, por si só, permitiam inferir o que viria no bojo do contexto. Eis uma delas: “Todo brasileiro, mesmo o alvo de cabelo louro traz na alma, quando não na alma e no corpo (...) a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro".
A certa altura, dá a entender que a miscigenação que impera na formação da estirpe brasileira teve como ponto de partida a cama e a cozinha.
Em outra pitoresca afirmação, dava conta de que: “O europeu saltava em terra escorregando em índia nua; os próprios padres da Companhia precisavam descer com cuidado, senão atolavam o pé em carne. Muitos clérigos, dos outros, deixaram-se contaminar pela devassidão. As mulheres eram as primeiras a se entregarem aos brancos, as mais ardentes indo esfregar-se nas pernas desses que supunham deuses. Davam-se ao europeu por um pente ou um caco de espelho”.
Assim, aprendemos que, os senhores de engenho trataram das providências de cama e mesa levando, também, para a cozinha, as índias e as negras com as quais compartilhavam os aposentos da “casa grande”.
Também é certo que, em razão de particularidades ou de maior amplitude no conhecimento das comilanças, as negras findaram por impor, no processo de miscigenação cultural, as bases da culinária africana.
Felizmente, para o bem geral da nação, a influência indígena também se fez valer, perpetuando-se até os nossos dias numa deliciosa fusão de gostos, ingredientes, temperos e preparações que se apresentam na fartura e variedade de pratos à nossa disposição.
É impossível contar ou enunciar, os pratos “típicos” apresentados pelos brasileiros de todos os pontos da Rosa dos Ventos. Todavia, como no caso dos brasileiros da citação de Gilberto Freyre, é um tipo de mistura que não existe em nenhum outro lugar do mundo. “Só tem por aqui”!
Não foi sem sentido que boa parte dos turistas entrevistados deixou clara a estupefação pela “quantidade e variedade” das comidas, quase todos enaltecendo o paladar e o perfume dos nossos quitutes.
Por outro lado, nesse maravilhoso caldo cultural estão inseridos sentimentos, emoções e, até mesmo, certa devoção ao nosso comer.
É nesse ponto que, carinhosamente, a arte dos versos e da música se associa para louvar os sabores, as cores e os perfumes que aromatizam a nossa arte culinária.
Vários são os compositores que tiveram inspiração para enveredar por esse delicioso terreno. Nesse texto, dou “vivas” a todos os compositores e artistas que dedicaram um tempo para cantar esse escaninho da arte, anexando o trabalho magistral dos compositores e brasilienses Daniel Júnior, Eugênio Monteiro e Alceste Almeida. O título é o mesmo da crônica, “Sabor Brasileiro”. A interpretação é da cantora, também de Brasília, Célia Rabello que podemos ouvir no YouTube, no link abaixo. Bom apetite!
https://www.youtube.com/watch?v=nzReVJTCEn8
SABOR BRASILEIRO
Sarapatel, caruru, bobó de camarão, mungunzá.
Pequi, arroz, vatapá, é tão bom, quem provar vai gostar.
Carne de sol, quiabo, aipim, farta, feijoada, cachaça e limão.
Tutu no fogo alimenta é tão bom, ninguém pode negar.
Uma rabada bem temperada ou tambaqui.
Um bom guisado, frango com quiabo, só tem por aqui.
Para beber um bom caldo de cana, uma água de coco gelada.
Sobremesa, queijo, goiabada, cocada ou quindim
Bis
Sarapatel, caruru, bobó de camarão, mungunzá.
Pequi, arroz, vatapá, é tão bom, quem provar vai gostar.
Carne de sol, quiabo, aipim, farta feijoada, cachaça e limão.
Tutu no fogo alimenta é tão bom, ninguém pode negar.
Uma rabada bem temperada ou tambaqui.
Um bom guisado, frango com quiabo, só tem por aqui.
Para beber um bom caldo de cana, uma água de coco gelada.
Sobremesa, queijo, goiabada, cocada ou quindim.