A ESPINGARDA PICA PAU
A espingarda Pica Pau.
Reunida na casa do Zé Guardinha, a turma preparou uma ferramenta incrível: uma espingarda Pica Pau. A lazarina ou pica pau é um modelo de espingarda de cano único muito usado no Nordeste para caçar aves, de mesmo funcionamento dos bacamartes usados pelos bandeirantes, É fácil de ser fabricada, o que possibilita a montagem caseira dessa arma. Para o atirador usar a pica pau, deve colocar pólvora pela boca do cano na quantidade que desejar e colocar uma bucha de papel bem socada. A seguir coloca bolinhas de chumbo na granulometria que deseja, aplica nova bucha e volta a socar. Na culatra, existe um pequeno orifício e ali coloca-se um espoleta. O gatilho aciona um batente através de uma mola, que bate na espoleta. A espoleta por sua vez explode e serve de estopim, através do orifício, para a pólvora contida no cano, que explode e, através dessa explosão, impulsiona as bolas de chumbo violentamente e estas são os projéteis da lazarina. A nossa pica pau foi feita com pedaço de tabua como cabo, cano de eletroduto de instalações caseiras amarrado ao cabo com arame, orifício da culatra muito grande, gatilho de arame ligado a uma borracha que puxava o batente e acionava a espoleta. Quando cheguei a pica pau estava carregada com bastante pólvora bem socada e não usaríamos chumbos. A questão era quem tinha coragem de atirar com aquela geringonça. Todos com medo da explosão, sem saber o que aconteceria ao usar aquela “arma”. Para resolver o impasse, falei para o Cadão me dar a pica pau, que eu atiraria. Me deram a espingarda, subi numa pequena árvore, encostei o rosto no cabo, fechei os olhos e acionei o gatilho. A explosão pareceu acontecer dentro do meu cérebro, senti meu rosto arder. Abri os olhos, meus amigos olhando para mim assustados, o cano da pica pau aberto como uma flor e solto do cabo. Como eu estava sem camisa, olhei meu braço. Estava todo ensangüentado. Aparece o Arnaldo Bonacha e Haroldinho berrando. Entraram pelo quintal adentro, esbaforidos, dizendo que nós éramos malucos, que podíamos matar alguém. Pegou a pica pau da minha mão e sem para de falar disse que iria entregar a “arma” à polícia. Saiu pela rua fazendo discurso sobre o perigo das armas de fogo, que “esses moleques vivem fazendo bobagem”, etc. Quando acionei o gatilho de olhos fechados a explosão fez com que jorrasse fogo pelas duas extremidade: boca e culatra e eu havia recebido no rosto e no braço direito a língua de fogo em cheio. Atravessei a rua e entrei em casa direto para o espelho do banheiro. Meu rosto estava pintado de vermelho dos grãos de pólvora. Minha sorte foi acionar o gatilho com os olhos fechados, poderia não estar vendo esse texto.O aspecto era horroroso, mas era ferimento superficial e sarou logo. Pica Pau, nunca mais.