ASSOMBRAÇÃO

O primo Anastácio tinha uma velha camioneta "FORD", pegando

e executando pequenos serviços de entrega pelas vizinhanças de Paraope-

ba, o que lhe garantia o leite das crianças, uma penca de oito meninos, es-

cadinha dos dois aos dez anos.

Apanhava uns tijolos aqui, descarregava na Fazenda da Ponte, de lá saía

com uma carga de milho para a venda do Juca Totó, no Cedro, de lá partia

com latas de óleo e sacos de cimento para o Sítio das Traíras e assim por

diante. Trabalhador como um mouro, primo Anastácio. E dono de um gran-

de coração.

Certa ocasião Anastácio vinha trazendo um caixão apanhado na Funerá-

ria de Matozinhos, encomendado pela família de em defunto de Paraopeba.

A tarde ensolarada de repente ficou cinza, com nuvens de chumbo car-

gando os céus. Anastácio meneou a cabeça e acelerou o veículo, pensan-

do em chegar antes do temporal ao seu destino.

Numa curva da estrada, debaixo de um pequizeiro, um caboclo fez si-

nal pedindo carona. Anastácio parou o carro e o sujeito trepou na carro-

ceria, acomodando-se ao lado do caixão. A urna funerária não o incomo-

dava nem um pouco.

Daí a pouco o tempo fechou de vez e os primeiros pingos de chuva vie-

ram molhar o caroneiro. O temporal desabou e a água encharcou a terra

seca do cerrado, refrescando o ar e adubando o solo maltratado.

O passageiro na carroceria, incomodado com o aguaceiro, abriu a tampa do caixão e se meteu lá dentro, procurando se resguardar do temporal. Mais adiante, um casal com um filho nos braços sinalizou, pe-

dindo carona ao Anastácio, bom coração, o qual parou o carro e mandou

que subissem.

Continuou a viagem e ficou atento às poças d,água na estrada, as quais escondiam grandes buracos. Era preciso muita cautela. Logo de-

pois de Sete Lagoas, o tempo melhorou. Ficou só um chuvisco enjoado, mas o sol mostrou sua cara, a principio com timidez para depois derramar seus raios de luz em profusão.

Daí a pouco, numa curva, a tampa do caixão se abriu e o caboclo que

viajava lá dentro perguntou ao casal de caronas, na maior calma:-

"- E aí, compadres? A chuva já passou? "

Foi um desespero só, a mulher jogou o filho pro alto e saltou, que nem

cabrita, no descampado, seguida pelo seu companheiro apavorado, caindo aos trambolhões, barranco abaixo, chorando e berrando de medo da "assombração" !...

-o-o-o-o-o-

B.Hte., 14/09/20

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 14/09/2020
Reeditado em 14/09/2020
Código do texto: T7062805
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