A Cartomante



“Ser ou não ser, eis a questão.”
(William Shakespeare)

A maior parte dos casos por nós vividos tão só posteriormente, mediante amadurecimento, é que os refletimos com sabedoria e entendimento.
Foi exatamente acerca de um desses momentos que me peguei rindo de uma situação quando ainda muito jovem.
Na ocasião, já me sentia bem adulta, mas como, até hoje, uma eterna sonhadora, a imaginar o seu príncipe (sem cavalo, é claro), com todos os predicados que envolviam tal personagem!
Fui criada, tendo por base uma educação modesta, porém dentro dos rigores da época. Nem tão religiosa – embora meus pais tivessem participado do Movimento Mariano –, nem tão cética. Valendo salientar que convivi mentalmente com todos os bichos-papões da minha infância... Só depois do “Sítio do Picapau Amarelo”, de Monteiro Lobato, me tornei amiga da Cuca.
Assim me fiz adulta, temendo algumas coisas e enfrentando outras tantas.
Voltando ao assunto primeiro. Era uma tarde ensolarada de sábado e minha grande amiga, sabendo que o meu príncipe não viria ao meu encontro, sugeriu irmos a uma cartomante.
Tentei resistir, contudo a curiosidade foi mais forte. No caminho ainda ia contestando e questionando as adivinhações que, geralmente, eram enganosas.
Fiel seguidora da cartomante, da qual se dizia amiga, ela rebatia todos os meus questionamentos.
O tempo passou rápido e chegamos, enfim, à casa da vidente. Com a intenção de que eu confiasse mais nas predições, sugeriu que eu fosse a primeira a entrar.
Após cumprimentos, a cartomante embaralhou as cartas e me pediu que as separassem em duas partes. A partir daí, passou a desvendar um a um os meus segredos. Lógico que o que, de fato, eu queria saber era sobre o meu príncipe, cujo namoro era recente. Analisando hoje a situação, acredito que ela, propositalmente, foi “escanteando”, enquanto pode, as notícias (não muito boas) sobre o amor da minha vida. Talvez buscando uma forma mais amena para me contar as “novidades”.
Mais uma vez cortei as cartas e, pela cara dela, não gostei... Disse-me coisas inacreditáveis a respeito dele. Inclusive, ela insinuou que, naquele momento, ele estava com outra, e, tinha mais, era um compromisso sério. Quase tive um chilique. Preocupada com a minha reação e, diante da minha fúria, me pediu que tivesse calma, pois tudo se arranjaria. Ele seria, sim, a pessoa com quem eu passaria o resto da minha vida – e não é que ela acertou, pelo menos até esta data. Bastando, para tanto, confiar, pois da sua própria boca, ouviria a história… Momentaneamente, fiquei mais calma.
Mas, os dias que se seguiram foram torturantes. Olhava nos seus olhos, procurando descobrir a verdade. “Ser ou não ser, eis a questão”, tal sentença não saía do meu pensamento. E se fosse verdade? Conseguiria eu perdoar os deslizes do meu “Príncipe Encantado”? Sinceramente já duvidava dos seus encantamentos.
No entanto, a paciência era a palavra de ordem. Para que tudo desse certo, eu precisava me controlar, pois tinha que ouvir dele a “verdade” – verdade que eu já soubera através da cartomante.
Quinze longos dias se passaram, até ele me contar tudo.
Calmamente, ouvi ponto por ponto o relato do acontecido.
O interessante é que estava tão feliz, que não conseguia controlar um meio riso, enquanto ele relatava a própria história. Enfezado, parou e me perguntou o motivo de meu comportamento.
Percebendo a sua chateação, mesmo sem querer, contei-lhe a verdade.
Incrédulo, ficou achando que alguém pudesse ter me contado antecipadamente a história. De fato, sim, embora de forma inusitada!
Mas, tudo terminou bem.
Fato é que, a partir daquele momento, descobri um pouco mais sobre a criação divina. Passei a respeitar, e não a temer, as pessoas capazes de “ler” a mente alheia. Um “dom” que, se bem empregado, pode, sim, auxiliar no futuro dos inseguros.
Uma coisa é certa: pressupor o futuro de alguém, mediante o seu presente, é algo arriscado demais quando o elemento principal no consórcio é um ser humano. Comigo deu certo, todavia nem sempre é assim.
A nossa insegurança emocional, às vezes, nos leva a procurar fora as respostas para os nossos desajustes reais.
Acredito piamente na “força interior”, pois foi ela a “autora” do desfecho desta minha história.
O nosso pensamento está ligado diretamente a Deus, portanto é n’Ele que devemos nos fortalecer, e fazer acontecer, com alegria e sucesso, o nosso “vir a ser”.
“Mãe Joana lê a sua vida nas cartas. Vamos fazer uma consulta?”
Vanda Jacinto
Enviado por Vanda Jacinto em 07/09/2020
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