Meu Pai Odiava Jogos de Azar
Por Nemilson Vieira de Morais (*)
Num período da sua vida, meu pai trabalhou como caixeiro-viajante. Quando ainda residia no Estado do Maranhão lá pela década de 1950, creio.
Sua atividade consistia na aquisição, troca e venda de joias de ouro e prata: pulseiras, cordões, colares, anéis, alianças, brincos, relógios de pulso e de bolso. — Haviam uns de marcas famosas que só os ricos usavam, como o Ômega Ferradura, o Mido e outros.
Comercializava peças novas e recebia às usadas nas transações que fazia. Na sua espertise de negociante, era quase impossível deixar escapar-lhe um bom negócio.
Nos contava que naquele tempo a pessoa tinha a condição financeira e não encontrava o produto que desejava adquirir. Por exemplo, um rádio, um relógio, uma bicicleta, uma joia qualquer…
SEU FORNECEDOR
As mercadorias de meu pai eram oriundas de uma ourivesaria de Fortaleza (CE). Creio que esta, também fabricava algumas dessas peças que distribuía. O nome do empresário ou da sua distribuidora (conceituado da capital cearense), fora revelado.
O trajeto das compras e vendas desses produtos (realizadas por meu pai), eram feitos em lombos de burros (mulas).
— Animais muito resistentes às cavalgadas às longas distâncias. Daí o motivo que o levou a possuir bons animais de montaria (mesmo após deixar essa lide).
TRABALHO DE ALTO RISCO
Não é do meu conhecimento, dele ter feito este trabalho com outras pessoas.
A compra, a venda, o transporte dessas cargas valiosas e, dinheiro em espécie, se tornava um perigo constante. — Por certo meu pai se dava conta disso.
Naqueles ermos ainda haviam fortes resquícios do cangaço e ainda que andasse prevenido com boas armas, farta munição e disposição, isso não lhe garantia tanta segurança assim.
FIADOR DE UM HOMEM
Uma vez que pôde contar com a companhia de alguém nas suas viagens a serviço, por aqueles fim de mundo resultou-lhe numa frustração.
Trata-se de um vizinho que tentou ajudá-lo. — Sem um trabalho definido e uma família numerosa, em necessidades...
Deu a ele um animal arreado, para a viagem, o apresentou ao seu fornecedor no Ceará e, garantiu a sua idoneidade…
— Prontamente o homem fora concedido naquela aquisição desses produtos de prata e ouro, sem tanta burocracia a isso e quase sem uma garantia formal da transação: como cheques, notas promissórias, duplicatas…
O empresário cearense teve como garantia do negócio, a palavra do meu pai. — Sendo um fiador do senhor. Um bom nome já valeu muito e ainda vale; melhor coisa que se pode ter.
A DECEPÇÃO
O pai explicou o serviço ao homem e caíram no mundo, na lida; num ritual programático das festas religiosas que já fazia há um bom tempo. Hospedavam-se juntos e atuavam comercialmente, separados, nos lugares festivos… em cidades grandes e pequenas, do interior dos Estados nordestinos do Ceará, Maranhão…
Depois de alguns dias de trabalho e, de boas vendas realizadas…
Num certo lugar, em dado momento, o então colega de jornada queria um dinheiro emprestado para troco e, prontamente o pai o arrumou.
Mais tarde, lá estava o senhor com o mesmo álibi: queria mais dinheiro para troco. O pai desconfiou da estória e procurou saber o que realmente acontecia.
A fundo nas investigações, descobriu: o moço estava envolvido até o pescoço em jogatinas; numa casa de jogos de cartas. Nessa brincadeira já havia perdido todo o apurado das vendas anteriores, as mercadorias e o empréstimo ao meu pai.
O meu velho pai quase enlouqueceu com aquilo… Passou a maior vergonha ao ter que explicar esse fato ao fornecedor cearense. Mas, para honrar o nome pagou a dívida, sozinho e odiou para sempre esse maldito jogo.
*Nemilson Vieira de Morais,
Gestor Ambiental/Acadêmico Literário.
(13:02:18).