Duplo Livramento

Por Nemilson Vieira (*)

Por ocasião das eleições municipais na minha cidade…

O clima político nessas disputas se elevava.

Era comum as discussões a cerca de um ou outro postulante a uma cadeira administrativa.

Nem sempre esses embates ficavam somente no campo das ideias: em dados momentos, os ânimos se acirravam, e as agressões deixavam de ser verbais; iam às vias de fato.

O povo comparecia aos comícios, para apoiar e ouvir os discursos inflamados dos distintos candidatos.

Geralmente esses encontros eram realizados em carrocerias de caminhões posicionados em locais estratégicos, pelas ruas; distritos, fazendas.

Eu mesmo andei a discursar numa dessas ocasiões, na campanha do deputado José Freire, e outras lideranças políticas estaduais e locais.

Alguns candidatos passavam dos limites nas promessas que faziam. Não cumpriam o prometido. “Desde aquele tempo a ‘mentira’ no mundo da política comandava o espetáculo.”

Havia perseguições políticas por parte de alguns mandatários, principalmente quando o eleitor declarava publicamente outra opção do seu voto.

Alguns pais precavidos orientavam os seus filhos a não participarem daquela agitação toda, e muito menos das questões políticas.

Opor-se ao governo (nos três níveis) não era recomendável.

No dia da votação a mãe ficava a orar a Deus, para que tudo ocorresse em paz, naquela disputa.

Pedia a nós que não saíssemos de casa: era perigoso. Não dava para saber o que poderia acontecer.

Os candidatos a vereadores e a prefeitos compareciam aos seus redutos eleitorais; a tirar fotos com o povo e ouvir as reclamações dos moradores.

Visitavam escolas, comunidades, hospitais; inauguravam comitês, reuniões com apoiadores, faziam as suas últimas promessas…

Um dos candidatos a prefeito esbanjava carisma: o Adelino, filho da terra, já havia administrado a nossa cidade. O outro candidato não me lembro bem quem era, mas, a campanha ia num bom nível. Qualquer um que ganhasse estava bom.

Ao aproximar-se o momento da prova dos nove. Em que as urnas iriam falar…

Um dia à tarde, próximo à votação, o João (preferi assim o chamar) eleitor de um dos candidatos tomava uns aperitivos e jogava conversa fora, no bar do tio Elias.

O Lázaro eleitor dum outro candidato saiu armado de casa. Sem uma autorização, e sem ser incomodado pelas autoridades policiais do lugar.

Adentrou-se ao dito bar e no ambiente, logo começou a discussão política.

Por pouco não causou uma tragédia maior.

O Lázaro saltou para fora da venda, num gesto de respeito ao proprietário e, convidou o João para resolver a questão na rua.

O convidado não pensou duas vezes: mais que depressa atendeu o chamado; num salto como uma serpente a dar o bote na presa. Perdeu o pulo e caiu.

O Lázaro negou o corpo e sacou da cintura um revólver de todo tamanho, à vista dos nossos olhares atônitos, já pronto a cuspir fogo no ralar da espoleta.

Debruçado na terra fria e pedregosa, aos pés do inimigo só a misericórdia de Deus… Ela fez-se presente…

O Lázaro só teve o trabalho de mirar a arma na cabeça de João e apertar o gatilho. — Bam! — Ai!

O projétil da arma cravou-se numa das mãos que, mesmo atingido levantou-se e atracou-se com o seu rival. O sangue esvaia-se…

João por cima de Lázaro quase toma uma facada de graça…

Um senhor ao lado observava os brigões com uma vontade de enorme de entrar na confusão tomou as dores do Lázaro.

Aproximou-se mais dos dois e puxou da cintura uma enorme peixeira, que mais parecia um punhal de tão grande que era.

A levantou o máximo que pôde e a descia como quem procurava um melhor lugar de furar o pobre João.

De repente o forte grito do meu pai ecoou pela rua afora:  “Não faça uma coisa dessa com o rapaz!"

O homem assustou-se e voltou com a faca para a bainha imediatamente.

O João a lutar bravamente sozinho para tomar a arma do inimigo, nem percebeu o tamanho do perigo que correu. — Por certo morreria sem saber do quê.

Com um joelho flexionado sobre Lázaro no chão, João o dominava.

A arma do seu inimigo político já estava na sua mão, o Elias entrou em ação e a tomou.

Nesse dia foram salvos da morte, o Lázaro e o João.

Por Deus, por meu pai e pelo tio Elias o pior não aconteceu...

*Nemilson Vieira

Acadêmico Literário.

Nem1000son@gmail.com