Entrelinhas do tempo



Com certeza o meu dia será excelente! Fui acolhida, logo cedo, por uma surpresa maravilhosa: mal abri uma das redes sociais da qual faço parte, deparei-me com uma canção de Charles Aznavour, Hier encore, indicação de uma amiga muito querida.
Fechei os olhos e me deixei levar pela doce melodia. Lógico que a ouvi mais de uma vez, a refletir sobre a canção que discorre sobre o tempo.
Aproveitei o momento e resgatei lembranças há muito esquecidas, assim pensei. Nada que merecesse preocupação, contudo foi um momento ímpar, poder olhar no caleidoscópio de minha mente e “ver” tantas situações agradáveis – e outras nem tanto. Melhor, eu diria: apenas vistas de um novo ângulo.
Mas, o que é o tempo? Quem é esse gentil cavalheiro que organiza diariamente minha vida e que, em muitos momentos, torna-se um algoz impiedoso?
Como pode o tempo, nesse tic-tac ruidoso, envolver-me em sua teia ardilosa, às vezes me mostrando que posso tudo em sua infinitude? Ou, então, fazendo-me correr contra ele próprio, para poder atingir os meus sonhos. Sim, adoro sonhar!
O tempo, creio eu, é uma incrível invenção humana e, por originar-se da mente de uma das mais perfeitas criações divinas, carrega consigo muito de Deus. É impressionante como nele transitamos livremente, de acordo com o nosso livre arbítrio.
Embora só hoje perceba essa façanha com tanta clareza...
Quando criança, inocentemente, vivemos sua plenitude entre uma brincadeira e outra. Nem sequer nos damos conta de sua existência. Apenas vivemos.
Na juventude, ele vem com uma nova roupagem, parece-nos um pouco curto, talvez, para a realização de tantos sonhos e loucuras. E, nesse efervescer hormonal, crentes de que o temos sob controle, esquecemo-nos do passado e nos lançamos para o futuro, incansavelmente, como donos da razão. Nessa época da nossa vida, o “eu” prevalece – acima de tudo e de todos.
Todavia, o tempo também nos reserva o amadurecimento do conhecimento adquirido em toda sua extensão. Esse é o “x” da questão! É nessa fase que paramos para refletir – em suas entrelinhas – e melhor entendê-lo. É assim com todos nós!
Sua precisão é tão rigorosa, que consegue nos situar nesse espaço tão vasto que é nossa vida, dividindo-a em ações presentes, passadas e futuras, conforme o momento vivido, classificando-as em efêmeras ou eternas.
Pensar hoje que seria uma boa pedida voltar no tempo e escolher um momento bom para se eternizar é infantilidade, pois cada momento teve, e tem, o seu encanto ou desencanto próprio.
Se melhor pensássemos, veríamos que nada do que passamos foi perda de tempo – sejam as desilusões, as tolices, as ideias descabidas, as perdas emocionais, materiais; enfim, observe que todas as experiências vividas, sofridas, vencidas, foram necessárias para que resultassem no que somos hoje.
Acredito que me dou muito bem com o meu tempo – alguns estresses acontecem, mas nada de tão paranoico.
Assim como em minha juventude, ainda permaneço com os pés na terra e os olhos arregalados, voltados para as estrelas, em busca de uma luz maior. Esse é o meu grande segredo da vida!
Vez por outra, abro as gavetas do tempo e, nelas, me delicio em longas caminhadas...
Não tenho medo de tédio, pois nunca estou sozinha. Meu mundo interior é bem maior de que esse externo e, nele, estão contidos todos os meus momentos, todos os meus “eus”.
Nada é tão interessante e misterioso quanto o tempo que envolve nossa vida em suas entrelinhas!
Vanda Jacinto
Enviado por Vanda Jacinto em 16/08/2020
Código do texto: T7036862
Classificação de conteúdo: seguro