DESTAS CHUVAS QUE NÃO CESSAM
Chove insistentemente .Quebro o nariz contra o vidro da janela espiando lá fora as águas rolando pelas calhas , os “copos de leite” – agradecidos - abrindo sorrisos imaculadamente brancos à grama umedecida.
A natureza entregue ao abraço cinzento do céu e no aconchego de minha casa,uma xícara de café aquece-me as mãos enquanto o pensamento voeja.
De repente, aquela casa de paredes desbotadas, a escada que levava ao sótão escondida por trás da cortina de chita e na janela que dava para o quintal, um rosto vasculhando o espaço.
Tal como hoje, chovia, e a tarde sucumbia por igual ao abraço carrancudo daquele céu ora tão distanciado pelo tempo.
A força dos ventos obrigava aquele rosto a recuar um pouquinho.
Lá fora...
Balidos aflitos das cabras medrosas buscando refúgio na casa do forno.
Arvoredo contorcendo-se no pomar, aves tentando proteger as ninhadas e aquele olhar disperso, os cotovelos apoiados na soleira da janela, as mãos em concha amparando a face sulcada pelos anos, espiava o “lá fora”.
Era “Nhá Maria”, minha avó paterna, aquela que com certo orgulho dizia trazer nas veias o sangue dos bugres.
A cada vez que ocorriam as tempestades ela parecia entrar em transe.
Postada na janela, calada , a tudo observava.
Era como que intimamente se travasse uma espécie de duelo.
O lado bugre percorrendo florestas escuras, o corpo quase desnudo submisso à força das águas, os cabelos longos e muito escuros esvoaçantes ,a face entregue ao açoite dos ventos...
Aldeia, turbilhões, A dança da chuva, pajelanças...
Um rio bufando, uma canoa recostada no barranco.
Raios e trovões encantavam-lhe aquele seu lado quase selvagem, revisitando lugares jamais percorridos, ainda que arraigados ao sangue que lhe pulsava.
Na outra metade, a doçura, a fragilidade da mulher que ,vez e outra, dava-se ao luxo de esponjar-se ao odor nostálgico do pó de arroz “Royal Briar”, mirar-se num pequeno espelho e por-se à espera do companheiro.
Chuvas e ventanias violentavam o potreiro e os campos estendidos além dele, reféns daquela fúria, apenas ouviam a súplica das curucacas temendo por seus filhotes.
E quando a natureza libertava-se daquela truculência, os céus iam-se azulando de manso e, embarcada numa brisa suave ela recobrava-se do transe.
Assim, abraçados, os dois lados daquela melhor moldavam-se numa criatura serena postada ao redor do fogão a lenha a fritar bolinhos da graxa.
Sempre que chove e raios e trovões riscam os céus, vêm -me à lembrança aquela senhora que mergulhava agreste nas energias dos temporais e retornava revestida da brandura de campos umedecidos ao convívio de seus familiares.
Tenho alguns traços desta guerreira palpitantes em mim.Experimento também algumas sensações de temores e admiração a relâmpagos e seus estampidos. Empreendo viagens pelas veredas de minhas florestas interiores e nas bonanças, quando de meus retornos, empresto-me olhares a girasóis itinerantes.
Agora,na cozinha de pouca luminosidade, bananas me sondam com olhares provocativos.
Incorporado da serenidade de “Nhá Maria”, vou fritar bolinhos de chuva.
(Recheados com banana, é claro)
“...E quando vinham as tempestades,duas facetas daquela mulher conflitavam-se.Metade sensível: temia.A outra metade,admirava raios e trovões.”
Chove insistentemente .Quebro o nariz contra o vidro da janela espiando lá fora as águas rolando pelas calhas , os “copos de leite” – agradecidos - abrindo sorrisos imaculadamente brancos à grama umedecida.
A natureza entregue ao abraço cinzento do céu e no aconchego de minha casa,uma xícara de café aquece-me as mãos enquanto o pensamento voeja.
De repente, aquela casa de paredes desbotadas, a escada que levava ao sótão escondida por trás da cortina de chita e na janela que dava para o quintal, um rosto vasculhando o espaço.
Tal como hoje, chovia, e a tarde sucumbia por igual ao abraço carrancudo daquele céu ora tão distanciado pelo tempo.
A força dos ventos obrigava aquele rosto a recuar um pouquinho.
Lá fora...
Balidos aflitos das cabras medrosas buscando refúgio na casa do forno.
Arvoredo contorcendo-se no pomar, aves tentando proteger as ninhadas e aquele olhar disperso, os cotovelos apoiados na soleira da janela, as mãos em concha amparando a face sulcada pelos anos, espiava o “lá fora”.
Era “Nhá Maria”, minha avó paterna, aquela que com certo orgulho dizia trazer nas veias o sangue dos bugres.
A cada vez que ocorriam as tempestades ela parecia entrar em transe.
Postada na janela, calada , a tudo observava.
Era como que intimamente se travasse uma espécie de duelo.
O lado bugre percorrendo florestas escuras, o corpo quase desnudo submisso à força das águas, os cabelos longos e muito escuros esvoaçantes ,a face entregue ao açoite dos ventos...
Aldeia, turbilhões, A dança da chuva, pajelanças...
Um rio bufando, uma canoa recostada no barranco.
Raios e trovões encantavam-lhe aquele seu lado quase selvagem, revisitando lugares jamais percorridos, ainda que arraigados ao sangue que lhe pulsava.
Na outra metade, a doçura, a fragilidade da mulher que ,vez e outra, dava-se ao luxo de esponjar-se ao odor nostálgico do pó de arroz “Royal Briar”, mirar-se num pequeno espelho e por-se à espera do companheiro.
Chuvas e ventanias violentavam o potreiro e os campos estendidos além dele, reféns daquela fúria, apenas ouviam a súplica das curucacas temendo por seus filhotes.
E quando a natureza libertava-se daquela truculência, os céus iam-se azulando de manso e, embarcada numa brisa suave ela recobrava-se do transe.
Assim, abraçados, os dois lados daquela melhor moldavam-se numa criatura serena postada ao redor do fogão a lenha a fritar bolinhos da graxa.
Sempre que chove e raios e trovões riscam os céus, vêm -me à lembrança aquela senhora que mergulhava agreste nas energias dos temporais e retornava revestida da brandura de campos umedecidos ao convívio de seus familiares.
Tenho alguns traços desta guerreira palpitantes em mim.Experimento também algumas sensações de temores e admiração a relâmpagos e seus estampidos. Empreendo viagens pelas veredas de minhas florestas interiores e nas bonanças, quando de meus retornos, empresto-me olhares a girasóis itinerantes.
Agora,na cozinha de pouca luminosidade, bananas me sondam com olhares provocativos.
Incorporado da serenidade de “Nhá Maria”, vou fritar bolinhos de chuva.
(Recheados com banana, é claro)