Os cacos de vidro

Fez aquele barulho de vidro estilhaçado, e me fez perceber que eu batera um cinzeiro antigo de vidro, que gosto muito, na garrafa de água. O cinzeiro não tem mais a finalidade de antes, mas serve de pires para encaixar a garrafa de água. Uns cacos caíram lá no chão, e meus olhos acompanharam... Ah, que dó! Recolhi os cacos e quis colar. Pensei: a gente não deve desistir das coisas porque essas quebraram, ou estragaram, ou não são perfeitas mais... eu posso até ser jurássica nesse modo de pensar. A minha geração viveu consertando as coisas. Consertava-se a TV, o guarda-roupa, o ventilador, o liquidificador, a máquina de lavar. Consertava- se o coração colando os cacos com a cola do amor próprio... suturava-se a alma, emendava-se o mal-feito ao pedido de perdão. Sabia dizer "obrigado", ou "pedir licença". A minha geração viveu a vida com mais intensidade e profundidade. Permitiu-se frustrar mais e isso resultou em pessoas mais fortes e resilientes. Pensando nisso, guardei os caquinhos pra colar com a cola da esperança e da gratidão. Mania de velha? Não! Mania de amar demais a vida e as pessoas, não permitindo a mim jogar ninguém no lixo.

Cassia Caryne
Enviado por Cassia Caryne em 14/08/2020
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