LUAR E PESCARIA

(Em memória do Mestre Zuza, meu pai)

Não sei pescar, é verdade! Nunca me interessei aprender, mesmo tendo a oportunidade com meu saudoso e polivalente pai, o mestre Zuza. Ele, de tudo sabia fazer um pouco, e pescar era um desse tudo. Não gostava de anzol, preferia mesmo a tarrafa que ele mesmo fazia. Aprendeu a tecer a “malha” com minha avó Inês, que o ensinou ainda a tecer {com Palha de coco babaçu} cofo, abano, quibane e esteira. Minha avó também era polivalente. Criou onze filhos e meu pai o mais velho, criou seis.

Sempre que era possível acompanhava meu pai nas pescarias pelos beirais do Rio Tocantins. Era um tempo em que o lajeiro não estava chagado pela derrama de esgoto in natura, e ainda não era base para usuários de drogas. O perigo de verdade, verdadeira, era deslizar e levar uma queda daquelas, ou então perder o equilíbrio pisando numa tracajá, quelônio, naquele tempo muito abundante por ali. Fora disso, era só não se afoitar, que tudo fluía e terminava bem.

Era bonito demais ver meu pai lançar a tarrafa no ar, principalmente quando a pescaria coincidia com noite de lua cheia. Com o Céu iluminado, a lanterna, daquelas de três carregos, raramente era ligada.

Com a lua refletida nas aguas do rio é que o mestre Zuza não precisava de lanterna, mesmo. Meu pai era muito bom naquilo. O instrumento caia na água sempre aberta, e com muita perfeição.

Chuaaaaaaa!!!!! Até o barulho da queda da rede na água se fazia belo. Era música para mim, pequeno infante. Depois do lance ele puxava o equipamento com todo cuidado para nenhum pescado escapar. Às vezes, a tarrafa enganchava e eu, com a água na cintura, morrendo de medo, também não sabia nadar, ia ajudá-lo com um pé dentro e outro fora da água. Na verdade, a ajuda era meramente moral, era só para dizer mesmo.

O cenário- rio/ lua cheia, ficava mais belo ainda quando as prateadas sardinhas e branquinhas faziam um esforço danado para escapar da malha. Com a luz do luar elas pareciam estrelas suspensas no ar ajudando a deixar a noite mais iluminada ainda. Vez por outra faziam companhia a elas, alguns mandis, piaus, corvinas e até, o hoje quase extinto, bico de pato.

Só quem não gostava dessa brincadeira toda era minha mãe Tereza. Fazia um peixe como ninguém, mas na hora de limpar o resultado da pescaria ela pulava fora. “Quer comer, trate-os”, dizia mamãe com o rosto franzido. Na verdade, não dava para ter certeza se ela estava falando sério ou brincando, mas não tinha problema; a limpeza ficava mesmo com meu pai que sabia que a recompensa viria horas depois com a família reunida saboreando a caldeirada temperada e preparada com amor pela dona Tereza, tarefa essa que nem obrigada transferia para outra pessoa. Depois, era só esperar pela próxima pescaria.

elson araujo
Enviado por elson araujo em 09/08/2020
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