POR UM PÉ DE ALFACE
POR UM PÉ DE ALFACE
Era apenas um pé de alface, o pedido feito por uma mulher que cultivava a sua horta orgânica. Depois de muitos dias de trabalho, os pés de alface estavam prontos para a venda. Dona Maria sai em busca de compradores, visitando pequenos mercados, onde costumeiramente vendia, nada conseguiu. Em consequência disso poderia perder toda a sua produção. Foi então que um pastor em visita à sua horta buscando comprar coentro para a moqueca, acabou ouvindo o relato de dona Maria – ela perderia toda a produção, uma vez que logo estariam estragadas. O preço era de R$1,00 o pé, quase nada em relação aos gastos que tivera. Em resposta, de imediato o pastor usando do telefone, consegue vender 100 pés de alface aos irmãos da igreja. Eu comprei cinco pés, estava pensando: para duas pessoas era muito, mas o que fazer para melhorar a “ajuda”. Perguntei ao pastor: alguma ajuda financeira pastor? Ele disse não! Pensei comigo, mas é tão pouco. Contudo, esse foi o pedido de dona Maria, ela não queria ter prejuízo ainda maior. Por um pé de alface, tantos pensamentos ocorreram – por tão pouco, aquela mulher ficou muito agradecida.
Em tempos em que a solidariedade tem se transformado numa oportunidade de exercitar o amor ao próximo, como não enxergar a necessidade das pessoas que estão honestamente querendo resolver o seu problema. A minha vontade foi a de comprar toda a produção da horta de dona Maria, mas seria esta a melhor solução? Talvez, momentaneamente sim. Dias virão em que dona Maria não deverá desistir do seu trabalho, é o que de mais digno uma pessoa honesta pensaria, e ninguém jamais poderia fazer uma troca por torná-la inútil, por exemplo: oferecendo uma cesta básica todo mês. Via de regra, dessas situações prevalecem os políticos, e bem assim aqueles que são preguiçosos, um marginalizando e o outro marginalizado, tendo como resultado o encabrestamento por líderes oportunistas. Pode ser por apenas um pé de alface, no entanto, o valor moral poderá ser mantido; o espírito de luta ser desafiado; a fé motivacional renovada na crença de que a vitória ainda será possível. O homem do campo bem entende de situações como esta – hoje não choveu, mas ainda virá a chuva e novo plantio será feito.
Em nosso projeto social com famílias de catadores de material reciclável, coisa nascida do coração, procuramos ajudar uma comunidade inteira, mesmo com poucos recursos. Em princípio, algumas cestas básicas, mas prevalecendo em ensinar que poderiam ter o sustento de suas famílias aprendendo a produzir, plantando na excelente área por eles ocupada – trabalho difícil para aqueles que criaram seus filhos naquele ambiente – desacreditados de tudo e de todos. Depois do primeiro ano, tendo ensinado a plantar, produzir vasos de cimento para vender na feira, tudo isso foi feito, sem, no entanto, apresentar resultado efetivo. Por um acaso, surgiu uma pessoa cheia de bondade, e a cada semana trazia o porta malas do carro cheio – cestas básicas verdura e algumas roupas. Isso durou algum tempo, e logo caiu no esquecimento – o que já era previsto, e apesar de nossa advertência de que melhor teria sido “ensinar a pescar”. Como já era previsto, não deixamos que o projeto se perdesse no tempo. Havíamos plantado batatas, aipim, mamão, abóbora e verduras, até alguns porcos foram criados. Vindo a pandemia, foi a salvação da lavoura. Completados dois anos de projeto, parece não ter ficado nada. Ninguém foi capaz de plantar uma semente qualquer. Por isso mesmo, o sentimento pelo esforço de doa Maria estava resolvido, foi mais honroso ter comprado cinco pés de alface e saber que dona Maria continuará a sua saga. Maior valor tem o que se produz com o trabalho, o pouco pode se tornar em muito para quem acredita que acima de tudo há um Deus, Senhor de todas as coisas e que pode transformar em riqueza, mesmo que seja apenas, a partir de um pé de alface. Dona Maria ficou feliz por todos aqueles que compraram apenas um pé de alface.
03\08\2020