Café servido na mesa e a solidão lhe fazendo companhia de forma discreta. A cadeira parecia vazia, mas os sentimentos estavam amontoados feito roupa suja em cesto. A colher na mão fazia um movimento de lá pra cá com som de sino, ritual de purificação que repetia ao acordar. No guardanapo, agora manchado de café, uma sombra impressa revelava uma nuvem escura. A caneta ia fazendo um zigue-zague para não atingir o espaço úmido em decomposição. A campainha tocou e ela se levantou, descalço e ajeitando o cabelo. No olho mágico cabia um jovem rapaz com um bolo na mão: pena que eram boletos do cartão de crédito recheados com suas últimas emoções transformadas em liberdade. Queria trancar a porta com cadeado e apagar a memória, porque “pra gastar tem que ganhar”, como bem dizia seu pai, mas foi tomada por uma compulsão, e para preencher seus vazios, resolveu trocar algumas peças de lugar. Vida que segue: “se abriu a porta, suporta o vento”, alertava o pai, então se joga no furacão:
- Bom dia, Marquito! Espero que traga boas notícias?
- Cartas e mais cartas... Sem jogos. Os bancos te amam! Sinta-se privilegiada.
- Ou o contrário. Meu “crush bank” não tem sangue de barata e enfatiza a distância entre a sua renda e a minha. É um abusador de mulheres com a emoção malemolente e o tecido adiposo fazendo cócegas. Obrigada! Bye.
- Mas uma emoção perdida por aí, sem controle. Desordenada essa infeliz que invalidou a racionalidade, não foi o gol do Brasil no tetracampeonato, nem a Byoncé ao vivo. Perdi a emoção e com a ela a razão, coitada! Café forte, vem!

 
Mônica Cordeiro
Enviado por Mônica Cordeiro em 04/08/2020
Reeditado em 04/08/2020
Código do texto: T7026170
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