A BANDEIRA HÁ DE CONTINUAR TREMULANDO!

“Contra as ideias da força, a força das ideias”

(Florestan Fernandes)

Claudio Chaves

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A FRASE (Contra as ideias da força, a força das ideias) de Florestan Fernandes, um dos ícones das ciências humanas [quando isso não era coisa só de ‘cumunistas’ ou de devotos do diabo] no Brasil foi o slogan de sua campanha para deputado federal em 1986, após seu retorno do exílio e no auge do memorável movimento [que também não era só de ‘cumunistas’) das Diretas Já, que exigia eleições diretas para a escolha do próximo presidente da República, o que viria a acontecer apenas em 1989, com a eleição [infelizmente] de Fernando Collor de Melo.

A PROPOSTA de Fernandes era, embora audaciosa, objetiva: a brutalidade (somada à covardia, incompetência e desonestidade) da ditadura militar já havia mostrado o seu fracasso. Aliás, é bom que não se olvide, embora apenas a elite econômica escravocrata e mesquinha brasileira se sentisse contemplada com aquele regime funesto e bizarro, não foi nenhuma revolução popular – a despeito das muitas tentativas – que removeu os militares do poder; eles o deixaram num reconhecimento, embora tardio e tácito, do seu estrondoso fracasso, deixando como heranças da megalomania ufanista, feridas jamais cicatrizáveis na alma de milhares de famílias de torturados, mortos e desaparecidos, o recrudescimento do acúmulo ilegal e imoral do latifúndio (inclusive na Amazônia – cujas consequências são percebidas atualmente), obras faraônicas eternamente inconclusas, uma dívida externa impagável e uma inflação estratosférica (que beirava os 300% - coisa que a geração atual sequer tem noção do que possa ser), além de um retrocesso tão profundo na política, nos direitos civis, nas artes e na cultura que, embora com todos os esforços que se seguiram nos 30 anos posteriores de abertura, ainda não foi possível uma recuperação confortável.

SOMENTE através de boas [no mais lato sentido possível) ideias poder-se-ia reverter esses espectros de coisas. Ou seja, Florestan propunha que contra todas as atrocidades (nem sempre propositais) e o retrocesso provocado pelas duas décadas do funesto regime – além, é claro, de toda a tradição antidemocrática, escravagista, elitista e excludente de nosso País – a saída jamais seria a força, a não ser a das ideias; em outras palavras, a força da educação, das artes, do conhecimento, da cultura...

É DENTRO desse contexto utópico (sem ser romântico nem alienador), que surge, em 2003, no encrave da Floresta Amazônica, no Sul do Amapá, a Academia Laranjalense de Letras (ALL), com, entre outros propósitos, promover o saber cultural, mas não apenas o acadêmico, senão toda a forma de cultura, incluindo (e até destacando) a popular; incentivar a formação de jovens leitores; reunir poetas escritores e outros fazedores de cultura e arte do município; oportunizar, principalmente à juventude, alternativas à [infelizmente somos obrigados a assim nominar] “cultura” da violência e às diversões triviais que, embora tenham a sua inegável contribuição, acabam gerando uma relação viciosa cujo custo-benefício nunca, nem de longe, se mostra compensador.

E, ASSIM, surge a primeira Biblioteca na comunidade que, por décadas, fora a mais empobrecida e mais estigmatizada (como zona de prostituição, narcotráfico e todo tipo de violência) do município, o Bairro Malvinas. A ALL, ainda realizaria, ao longo dos seus 17 anos, Feiras (bienais) de Cultura e Arte, nas quais sempre procurou destacar e reconhecer vários talentos locais, concursos literários voltados para estudantes da educação básica, além de produzir vários informes sobre Cultura e incentivar inúmeros outros projetos nessa mesma direção, como: o intercâmbio cultural Laranjal-França, a criação da Fundação Municipal de Cultura, a criação do Centro de Documentação e Memória do Município e o Projeto Farol, que encarna dezenas de subprojetos, todos voltados para o desenvolvimento cultural sustentável do município, podendo alcançar toda a região do Vale.

A INICIATIVA – embora mais por imposição das circunstâncias do que por reconhecimento da relevância – do Governo Municipal de reativar (ou fazer funcionar de fato) o Conselho Municipal de Cultura (com a publicação do Edital e, posteriormente, a eleição dos [7] componentes que representarão a sociedade civil), vem ao encontro – e é muito bem aceito, diga-se de passagem – dos anseios da ALL, cuja principal bandeira sempre foi a Cultura, e cujo pensamento norteador de seus fundadores e membros se encontra com o do saudoso Fernandes, no qual para combater as ideias da força, a mais eficaz estratégia será sempre a força das ideias – NOSSA BANDEIRA HÁ DE CONTINUAR TREMULANDO!

MAS se, a despeito de qualquer coisa, tivermos que apelar para qualquer ato mais extremo, que apelemos, no dizer de Joakim Antonio (2015), para o Vandalismo Poético: “Quando ninguém estiver vendo / Joga uma rosa e sai correndo”.