TEMPO ROUBADO

O dia tem vinte e quatro horas para todos. Uns sabem aproveitá-lo mais que os outros. Mas, mesmo assim é comum escutar dos filhos que os pais não tem tempo para eles. Os amigos pouco se encontram porque os afazeres não permitem. Muitos negócios são feitos na hora do almoço, cada minuto vale ouro. E assim, vai-se perdendo a oportunidade de ver um criança crescer, de uma planta brotar, de ver a lua nascer e o sol se pôr.

Mas eu me dei o luxo de me presentear com um momento desses. Esqueci os compromissos, os afazeres e me dei um instante para apreciar a vida. Era um dia lindo. Eu gosto de sol e ele estava esperto. O vento suavizava a temperatura e balançava as folhas das árvores que iam e vinham num compasso. Imaginei que estava assistindo um festival de balé. Esse espetáculo era aplaudido com confetes – as folhas caindo das árvores. Na plateia um único assistente, eu. As formiguinhas seguiam em procissão, tal qual os homens, não podiam parar de trabalhar. O beija flor precisava garantir o seu alimento e continuava sugando o néctar, sua fonte de energia. Eu me deliciava com todas essas observações quando fui interrompido por um humano e julguei que acabaria ali o meu prazer.

Antes que ele dissesse algo eu me adiantei dizendo “Sawabona”, cumprimento africano que significa eu te vejo, eu te respeito, eu te valorizo. Quantas vezes falamos com uma pessoa e não enxergamos esse indivíduo? É preciso ver além das vestes, dos adornos e sentir o seu eu, o ser e não o ter. Quando estamos leves e de bem com a vida, penetramos na aura das pessoas e criamos laços, empatia, cumplicidade vendo além do material. Muitas saudações de nosso dia-a-dia são automáticas, nem mesmo quando dizemos eu te amo vibramos com o seu sentido.

Mas eu estava de bem com a vida e me congratulei com o humano usando a expressão: Sawabona. Para surpresa minha tive a resposta: Shikoba, que significa eu existo para você. E contrariamente do que imaginei não interrompi ali minhas observações. Ele sentou do meu lado e continuamos nos deleitando com a natureza e todo belo que nos cercava.

O tempo foi roubado mas o lucro foi inestimável.

23.10.2020

Maria Dilma Ponte de Brito
Enviado por Maria Dilma Ponte de Brito em 22/07/2020
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