MEU SERVIÇO MILITAR: MEU PAI ME QUEBROU O GALHO
MEU SERVIÇO MILITAR: MEU PAI ME “QUEBROU O GALHO”.
Meu pai era militar, embora não fosse autoritário possuía orgulho de sua carreira e gostaria muito que eu seguisse seu exemplo. Era tudo que eu não queria, pois já tinha definido que cursaria engenharia, “sentar praça” não estava nos meus planos. Próximo à época de iniciar o serviço militar pedi ao Capitão Miorim que intercedesse junto a algum amigo para me colocar como excesso de contingente. Dias depois meu pai me levou a conversar com o capitão médico do então 2º Batalhão de Caçadores. Fomos muito bem recebidos e após meia hora de conversa com o médico, meu pai explanou meus motivos para não servir e solicitou que eu fosse liberado dos meus deveres para com o Exército. Escutamos que não haveria problemas e o capitão prometeu analisar a solicitação. Chegada à data de convocação, me apresentei aguardando ser dispensado. Não foi o que aconteceu. Incorporei na tropa, recebi a farda e iniciei os treinamentos de instruções, ordem unida, desmontar e montar fuzil, etc. Reclamei com meu pai. Disse que tivesse calma e aguardasse que eu seria liberado. Andar de farda era castigo para um jovem surfista, nadador e estudante acostumado a ter tudo à mão, com mamãe. Eu gostava de bailes, matinês dançantes no Praia Clube e Tumiarú em São Vicente e no Clube Internacional de Regatas em Santos, havia aprendido a dançar no famoso “dois pra lá, um pra cá”. Curtia os Beatles, samba e bossa nova. Dois amigos tocavam violão e nossa turma era convidada e visitar casas de amigas para curtirmos boa música regada a uísque e Cuba Libre, a moda da época. Era uma vida que a única preocupação era estudar, treinar natação, surfar. O resto era diversão. Passaram quinze dias e, após diversos rapazes serem dispensados, em uma ida ao ambulatório, perguntei ao capitão médico por que ainda não haviam liberado. Contrário ao comportamento afável da visita feita antes, o capitão me comunicou que como era um bom atleta e continuaria a prestar o serviço militar. Confesso que estava curtindo a experiência, pois desde criança freqüentei os quartéis em que me pai trabalhou e o ambiente não me era estranho. Cheguei em casa e protestei. Meu pai, com a calma que lhe era peculiar, explicou que seu amigo havia ligado e perguntou se haveria problema em que eu continuasse no exército. Respondeu que não tinha problema algum. E lá fui eu ser soldado, depois cabo. Foi uma experiência ótima, um ingresso na vida adulta, com as responsabilidades e deveres inerentes à disciplina militar. Em momento algum cogitei seguir carreira, mas guardo boas recordações em convivi com os mais diversos tipos de jovens, muitos com sérios problemas materiais. Lembro de alguns tipos inesquecíveis.
Hugo era um preto que simpatizei no primeiro momento. Esperto e inteligente, tinha resposta para tudo e um senso de humor sem igual. Quando o Sargento Renato, instrutor de nosso pelotão gritava uma ordem,Hugo sempre completava:”-Ou mais!”. Só ele ficava sério, todos em volta riam a ponto de sermos chamados à atenção. Era assim:
Sargento: “-Descansar!”
Hugo: “– Ou mais!”
Sargento: “–Pelotão, sentido!
Hugo:”- Ou mais!”
Era muito engraçado.
Outro cara era o Erik, um cara ruivo cheio de sardas, filho de alemães. Magro, não tinha coordenação motora. No terceiro dia de caserna, foi chamado à Sargenteação (correspondente ao RH civil), onde lhe comunicaram que não era apto à carreira militar. O rapaz começou a chorar, falou que queria permanecer servindo, pois era consciente de suas limitações e o exército era sua oportunidade de melhorar tanto física como emocionalmente. Voltou à tropa contente após revogarem sua dispensa. Como a maioria do pessoal era louco para se safar do exército, escutou muitas gozações.
José Maria, vindo do agreste nordestino era muito humilde e comia a comida do rancho com vontade. Uma vez comentei com ele que a comida era malfeita. Resposta:”-É ruim e é pouca!”.
O Maciel viera de Mato Grosso do Sul e, como havia se alistado em São Vicente, teve que servir no 2º B. C.Em 1984 encontrei-o em Cuiabá, era marqueteiro político.
Tinha o Paes, que quando chamava o numero dele, dava um berro: “-Paaaeeeeeeessss!”.
O Nogueira do clube Bandeirantes, morava ao lado do cemitério do Saboó.
Ferreira era uma figura,muito engraçado.
Meus amigos nadadores Luiz Rodolfo Ortiz, Sérgio Heleno e Eduardo Schieleman (Piu-Piu).
Meu pai era um sábio.
Paulo Miorim 22/07/2020