Parceria e Disponibilidade
Cabisbaixa e acuada, entre as folhas de um arbusto. Foi assim que a avistei. Não me pareceu certa aquela situação.
Observei-a por instantes, mas ela não se mexia, parecia morta. Fiquei pensando o que poderia ter acontecido, o que a teria deixado daquele jeito. Sempre fora tão leve e vivaz. Cheia de cores e rodeada de flores; invejada por sua beleza.
Aproximei-me bem devagar. Mas decidido a entender, apresentei-me. Ela se encolheu assustada, procurando um abrigo, como quem já sabe o que esperar. Tentei acalma-la, demonstrar que não a faria mal. Mas foi em vão. Decerto havia medo, pois perdera o brilho do olhar.
Insisti. Ela, então, reagiu agressivamente. Transformou seu corpo débil em um maciço eriçado, no intuito de afastar a dor que poderia causar. Só podia ser isso, vi cicatrizes em seu dorso.
Recuei. Não se pode prever a profundidade de uma ferida, nem tampouco ignorar a força de uma sobrevivente. Mas não desisti. Reconhecia nela algo que não experimentava há muito tempo. Embora não soubesse ao certo o que era, estava disposto a descobrir.
Ofereci meus sentimentos materializados em poesias; o brilho liso e esférico da pérola; o aroma e a maciez da rosa vermelha e a luz da lua para guardar seus sonhos das trevas nas noites solitárias. Ainda assim, não venci sua desconfiança.
Foi então que percebi. Era uma borboleta que perdera as asas e, com elas, a vontade de voar. Perguntei como as tinha perdido e ela disse que formigas, lagartos e aranhas sempre se aproximavam devagar e roubavam pedaços de suas asas. Para evitar a dor ela mesma as arrancara.
Percebendo sua angústia e movido por um sentimento inexplicável, arranquei uma das minhas e ofereci a ela. “Ninguém merece viver rastejando sendo capaz de voar”, disse-lhe. Ela, ainda atônita, duvidou: “é impossível voar com uma asa só.” Ao que rebati: “se dermos as mãos e as batermos juntas, iremos onde quisermos”.