Anos Dourados e Preconceito
SEMPRE fui fascinado pelos chamados Anos Dourados. Ainda sou, mas nunca neguei que era uma época muito mais preconceituosa. Posso afirmar isso porque fui testemunha ocular de cenas de preconceitos, vivi a época. Não vou nem falar do preconceito contra os filhos e famílias dos esquerdistas e comunistas. Vou apena citar outros casos.
Vejam bem, fui funcionário de um banco oficial, em Pesqueira, fim do agreste pernambucano, comecei a trabalhar em 1964. Logo que iniciei fui incumbido de ir ao cartório resolver um problema pertinente à inscrição de uma cédula rural. Era no tempo que não existia a Vara do Trabalho (jUstiça Trabalhista), as causas trabalhistas eram julgadas pelo juiz de direito e as audiências eram no cartório. Quando cheguei estava havendo uma dessas audiências. O juiz era sempre favorável ao patrão, no caso a grande fábrica de doces e massas de tomate. A cena era humilhante, um operário de cabeça baixa parecendo um réu acusado de assassinato, um advogado do sindicato fazendo o faz-de-conta e juiz todo-todo rei do pedaço. Num dado momento, gaguejando o advogado falou num certo direito, não me recordo qual, insalubridade ou horas-extras,algo dito apenas involuntariamente, sem muita vontade. Não prestou, o juiz arretou-se e rodou a baiana. Mandou o operário levantar a cabeça e berrou: - Você pensa que a Fábrica quer precisa de seus tostões, cabra?!!!!! Era esse o tratamento dado aos casos de reclamação trabalhista dos operários..
Havia ainda a exploração absurda e cruel das "parcerias agrícolas", o meio iníquo que as fábrica usavam para anão pagar o salário mínimo, estendido ao campo por Miguel Arraes. Osparceiros eram chamados de porcos,viviam em chiqueiros.
O ensino médio era privilégio dos filhos dos mais abastados nos colégios pagos da Diocese. Os filhos dos pobres só faziam o primário,quando faziam. Um prefeito da oposição no final dos anos sessenta criou um ginásio municipal misto e gratuito que funcionaria à noite com o curso médio.Foi um escândalo, logo a Igreja foi às rádios advertir que era um perigo ginásio misto porque os alunos poderiam engravidar as alunas. Mas diante da pressão dos pobres oginásio começou a funcionar.Mas a Igreja conseguiu com o juiz colocar um obstáculo, os alunos menores só poderiam ir pro ginásio acompanhados dos pais. Ora, a maioria faria serão nas fábricas. Essa "lei" caiu quando um jornal da capital denunciou o absurdo.
E a mulher?a mais discriminada era a desquitada, era nivelada quase às meretrizes. A maioria das mulheres só tinha direito a dar dois gritos: "Xô, galinha!" e "Cala a boca, menino!".
Nem tudoera um mar de rosas nos anos dourados. Inté.