SÍMEA, POR EXCELÊNCIA
Têm dias em que bate uma tristeza, uma vontade de estar em lugar nenhum, de ser invisível, ocultar-me do mundo, isolar-me e, simplesmente, não pensar em nada. Bloquear o pensamento, vendar os olhos e não ver ninguém, cerrar os ouvidos e não ouvir sandices e impropérios, calar a voz, que grita em silêncio e ecoa dentro de mim, querendo libertar minhas angústias.
Mas, nada disso é possível. Onde quer que eu vá, carrego comigo todas as dores de meu mundo particular, incrustadas em minha mente, cicatrizadas, ou não, em minha pele, e que vão debilitando meu corpo, alquebrado por marcas que me perseguem, mas que fortalecem meu caráter, que modelam meus ideais, que apontam meus erros, e que me dão perseverança para enfrentar desafios, e para viver intensamente.
Definitivamente, fugir do mundo não faz parte de minhas opções. Mesmo que eu tente, jamais desligo. Meu interruptor não tem off, meu sistema não fica sem conexão, nem pode dar pane. Não posso transformar-se em um autômato, sou sensível demais a tudo o que me cerca. Minhas percepções tornam-se tão fortes que sofro, e agonizo, não só as minhas dores, mas também as de outrem.
A sensação de impotência tem de ser erradicada de minhas entranhas para que eu possa libertar-me das amarras de minha existência e auxiliar outros a se libertarem. Minha alteridade não se cala porque sofro, ao contrário, torna-se mais presente, porque sou eu e sou todos, sou ilha e continente, ligados por um mar agitado de preocupações constantes, que me fazem parte indissociável de um todo incompleto.
O sentimento de humanidade que habita em mim é mais forte que minhas individualidades, e reflito, e discuto, e esbravejo, e contesto, e grito, e vou à luta, e não me calo, e registro no papel, tanto as minhas percepções quanto as de outrem, por meio dessa veia poética, que surgiu em mim, pela necessidade de dividir meus sentimentos e de absorver contextos alheios com os quais me identifico, e com outros que não conheço ou reconheço, mas que se entrelaçam com a minha vida, tirando-me a apatia e tornando-me viva.
Meu isolamento só pode ser mental, porque estou sempre acompanhada por pessoas com quem compartilho meu sentimento de ser gregário, dependente da presença e do amor de meus semelhantes. Uma símea; é o que sou. Por excelência!
Cleusa Piovesan
Direitos autorais Lei n.º 9.610/98.