LUTA-MULHER

Fui um espírito podado pela inocência de uma gravidez precoce que me obrigou a amadurecer rapidamente. Entre enganos e fantasias românticas, mergulhava na leitura, fuga de minha realidade que não correspondia à idealização natural das jovens daquela época.

A vida de "rainha do lar" me convenceu por muito tempo (16 anos) de que isso era a felicidade. Aí, a realidade das mentiras que envolviam a outra parte da minha relação conjugal "caiu de paraquedas", e em queda livre, sem proteção, e eu enfrentei a dor das traições, não só sexuais, mas ideológicas, e a consciência da violência psicológica de que fui vítima por 20 anos, até culminar na violência física, e me deparei com a dura tarefa de administrar o fim do casamento e a criação de três filhos adolescentes, revoltados.

Então, fica no ar a pergunta: o quanto uma mulher pode se anular em nome do amor e da união familiar?

Mas a vida é madrinha, não madrasta, para quem não vive do passado, e continua seu fluxo, com algumas páginas viradas, outras arrancadas, escrevendo cada nova página com mais atenção. Às vezes, com lágrimas, às vezes, com alegrias, mas sempre com determinação.

A partir desse "divisor de águas" turbulentas, diga-se, chamado divórcio, meu futuro eu tracei com régua e compasso e comecei a aparar as arestas para observar tudo sob novos ângulos; uns retos, outros, oblíquos, mas sem perder-me na geometria de meus objetivos.

Sonhos da adolescência retomados e foco na carreira profissional. E a literatura como fiel confidente e como válvula de escape, na leitura e na escrita. E assim, galgando cada degrau da formação acadêmica já tardia, começo a me aventurar na observação mais perspicaz das realidades sociais, e a direcionar minha mente e minha mão direita, nos meandros da existência, a engajar-me em minha luta-mulher, calada por tanto tempo, no círculo fechado do casamento e na ilusão do amor eterno.

Escrever tornou-se um ato de rebeldia, emocional e social, no qual despejo minhas angústias individuais e coletivas, particulares e universais. Não há um só dia em que eu não registre minhas impressões sobre a vida e sobre o mundo.

Meu ponto de observação está baseado em minhas vivências, em meus valores éticos e morais, em minha formação acadêmica, e em meu senso de alteridade. Esses são os quatro pilares de minha obra literária, às vezes, autobiográfica, às vezes, trivial, às vezes, universal, emotiva ou revoltada, sensível ou crítica, e sempre, cônscia de meu lugar, de minha luta-mulher, para conquistar meu espaço no universo literário, dominado pelos homens.

Mulher tem voz e quer vez para mostrar que não é mais peça de decoração, que não está na posição de submissão e de inferioridade, que a convenceram a ficar até fins do século XIX. E estou com essa bandeira da luta-mulher em punho, desfraldando-a para comemorar cada conquista, que não é só minha, mas de todas as mulheres que se libertaram do jugo do marido opressor, e daquelas que têm consciência de que seu lugar no mundo tem tanto valor quanto o de qualquer outro ser humano, e estão na luta pela igualdade de direitos.

Sou uma mente inquieta que não se acomoda, nem se conforma com a injustiça e não aceita mais o lugar-comum que tantas mulheres ainda idolatram: o lar, doce lar; gaiola de sonhos, mordaça de ideias, máscara de hipocrisia. Dou asas à liberdade de ser o quê, e estar onde eu quiser, tornei-me, de fato, MULHER!

Cleusa Piovesan

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Cleusa Piovesan
Enviado por Cleusa Piovesan em 15/07/2020
Código do texto: T7006873
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