COVID-19: OU "NOS ENCONTRAMOS", OU ESTAREMOS "PERDIDOS"!
COVID-19: OU "NOS ENCONTRAMOS", OU ESTAREMOS "PERDIDOS"!
Depois de quatro meses dedicados a cuidar, especialmente, de mim, estou sentindo que posso fugir ou me perder de mim mesma, pois já não vejo a realidade, como de fato é, trancafiada em casa como um animal acuado a espera do predador. E cuidar de mim apenas não basta, tenho que cuidar das pessoas do meu convívio, mesmo que seja à distância. E cuidar de meus compromissos, que agora são on-line, e criaram uma linha tênue entre o real e o virtual, que tem de ser ultrapassada, ou a “ultrapassada” serei eu.
Minha prisão não se constitui apenas em estar dentro de um espaço limitado, consiste em estar impotente diante da proporção incontrolável de um vírus, diante da crueldade de pessoas que, em momento tão grave, levam na brincadeira ou tentam tirar vantagens financeiras, e de um governo que privilegia a minoria, os empresários, tratando a maioria, o povo trabalhador, como peça descartável dentro do sistema capitalista. E médicos chegando ao ponto de exercer o papel de “deuses”, determinando que vive ou quem morre, que tem direito a um respirador, ou mais chances de sobrevida, tornando a população idosa quase descartável, na competição com um jovem.
Minha impotência vem das informações não confiáveis que recebo pelas mídias, que me dão ciência de que a humanidade não está preparada para catástrofe de tal proporção, pois lhe falta entender o sentido do vocábulo "humanidade", aquele sentimento e modo de ser que nos torna, verdadeiramente, humanos!
Estou aqui, perdendo-me em conjecturas... e em mais leituras... estou no décimo quarto livro (antes não havia tempo para isso) e, quiçá, possa conviver com essa visão infernal que estou tendo da atual situação. Um pouco de fantasia para me arrancar da crueldade da realidade que vivenciamos. Nem Dante descreveu tão bem o "inferno"! Um inferno provocado por um inimigo invisível, manipulado por outros inimigos, visivelmente interessados em ocultar dados estatísticos, criando além da pandemia, um pandemônio de Fake News, não bastasse o acúmulo de más notícias diárias.
O COVID-19 apresentou o lado mais mórbido do ser humano: o individualismo. Apresentaram-se os heróis, dispostos a enfrentar o problema, alguns com seu conhecimento especializado; outros, com sua solidariedade. E apresentaram-se os covardes, aqueles que buscam um culpado, sem pensar que a causa nesse momento não precisa ser atacada, combatida ou contida, a preocupação maior deve ser com as consequências, que não serão poucas e nem inexpressivas.
Somos seres gregários, por isso teremos não só uma população vítima de uma doença viral, mas uma população vítima de uma doença social, derivada da falta de interação e de conscientização de que o enfrentamento é necessário e de que todos têm de sacrificar-se um pouco, por um bem comum e maior do que qualquer “chilique” que alguém possa ter por conta do isolamento social: a vida!
Seremos vítimas da quebra do sistema econômico, pois não é o momento de adquirirmos bens supérfluos; as necessidades básicas vêm em primeiro plano, embora nunca tenha havido tantas promoções e tantas facilidades nos sistemas de venda on-line e deliveries. A economia se recupera de uma falência temporária; as vidas perdidas nessa pandemia não! Há controvérsias? Sim. O futuro nos dará as respostas, mas para isso precisamos manter-nos vivos.
E ainda seremos vítimas da depressão mental, fenômeno da modernidade, cuja cura encontra-se dentro de cada um. E quem não souber lidar com a situação de isolamento social, de caos em todos os setores a sua volta, fomentará a agenda de consultórios de psiquiatras e de psicólogos, perdidos dentro de si, tentando encontrar um sentido para continuar vivendo, tentando entender as males que um cárcere privado, que a falta de liberdade, de convivência social provocam, mesmo nas mentes mais sadias. Todos tentando se encontrar, num mundo que perdeu a noção do tempo, um tempo que era tão raro e que, agora, muitos não sabem o que fazer com ele.
Banalizar a gravidade do COVID-19 é brincar de Deus, ou considerar-se um haighlander, crendo no vazio de uma imortalidade impossível. A fantasia, a mitologia, as crenças têm de dar lugar à ciência para que se encontre logo um meio de conter a proliferação desse vírus, e todos estejam em segurança, mas, nessas horas, vejo que Sartre tem toda razão "o inferno são os outros". Não nos tornemos o inferno dos outros!
Cleusa Piovesan
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