O BAILE DO TERROR EM PIRACICABA
O BAILE DO TERROR EM PIRACICABA
Há ocasiões inesquecíveis na vida. Essa é uma delas. Convidado por meus amigos da Natação participei de uma competição estudantil em Americana, em 1966. Embora fosse aluno do Instituto de Educação Canadá, eu integraria a equipe do Colégio José Bonifácio. Onde hoje é a Reitoria da Universidade Santa Cecília, em Santos, ficavam as instalações do José Bonifácio, onde a maioria dos meus amigos de Natação do Clube Internacional de Regatas estudava. A competição seria na cidade de Americana. Nossa turma era composta de bons nadadores, na época o Internacional possuía a melhor equipe e vencia todas as competições. Participar de uma competição estudantil seria uma oportunidade de intercambiar experiências com nadadores de Americana e incentivar a prática desse esporte maravilhoso que é a Natação. Para nós, seria uma viagem de recreio, pois nosso esporte era pouco desenvolvido no interior paulista. Na viagem, fomos comentando que Americana é próxima de Piracicaba, onde tínhamos dois amigos que cursavam o curso de Agronomia na ESALQ- escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz, uma das primeiras instituições do ramo no Brasil, pertencente à USP - Universidade de São Paulo. O mais importante para nós é que haveria um baile no sábado à noite na Agronomia com a temática de filmes de Terror, e nós teríamos que ir nesse evento. Saímos de Santos de ônibus na sexta feira, as provas seriam no sábado e domingo. Chegados a Americana, cada um de nós ficou hospedado em casas de nadadores locais, e fomos muito bem acolhidos. Na época e diferença entre os costumes do interior e do litoral eram muito evidente. Éramos quase adultos e a maioria dos nadadores de Americana era iniciante. Nossas preocupações já visavam à vida adulta e a Natação, embora fosse paixão principal, compartilhava com diversões como bailes, festas, paqueras e coisas típicas de fim de adolescência. Fui acolhido por uma família muito simpática, o pai do nadador gostava de conversar e, orgulhoso de sua cidade, me fez uma longa exposição sobre a bonita Americana. Após escutá-lo, comentei que no sábado à noite iria visitar um tio muito doente em Piracicaba, já preparando terreno para justificar minha saída para o baile. A senhor ficou surpreso, mas acabou aceitando meus argumentos. Sábado, após as provas de natação, já de noite embarcamos em um ônibus com destino a Piracicaba. Na época, as repúblicas de estudantes eram famosas e tradicionais, pois passavam gerações de estudantes por cada uma. A república que nossos amigos moravam era uma típica casa de estudantes. Casa velha, com longas fiadas de garrafas vazias dependuradas ao lado das janelas, com porão alto e escada que acessava uma varanda e demais dependências, de nome Senzala. O portão estava aberto, entramos e ouvimos uma batucada de bongô e uma voz cantando a plenos pulmões. Era o Nelson Bussa, nosso amigo santista, sozinho na sala. O Faquir, também nadador, havia ido a Santos. O Faquir é uma grande figura, atualmente agrônomo e mora em Rondônia. Na época, era bem conhecido na cidade, pois andava pela cidade com um capote preto, acompanhado de um grande cão pastor alemão. Sentava em frente à república e, com uma faca descascava e comia cana de açúcar. Nelson adorou nossa chegada e, ali mesmo iniciamos beber alguma coisa, o que hoje é chamado de “esquenta”. Às onze horas fomos ao baile. Chegamos após uma boa caminhada. Nelson nos apresentou várias amigas e continuamos a beber. Os santistas eram famosos por serem animados e de imediato ficamos amigos das meninas, era tudo que queríamos. Bussa nos apresentou um japonês completamente bêbado, que nos divertiu muito a noite toda, de apelido Sabugo. A maioria das pessoas trajava roupas pretas e maquiagem de Drácula, Lobisomem, Múmia, etc. Lembro de um cara assustadoramente alto, que tinha nas mãos uma faca. Ao chegar perto reconheci Emil Rached, o jogador mais alto da seleção brasileira de basquete de todos os tempos, fantasiado de Drácula. Com dois metros e vinte de altura, o camarada realmente era gigante. Na realidade a faca era um facão, mas nas mãos de Emil dava impressão de ser pequena. Sabugo mexia com todo mundo e em várias ocasiões não deixamos que ela fosse agredido. Fazia tudo que nós, maldosamente, mandávamos. Demos muitas risadas e quase arrumamos confusão com pessoas da cidade. Quatro horas da madrugada, saímos apressados para embarcar no primeiro ônibus com destino à Americana. As cinco cheguei a casa em que estava hospedado e as oito fomos nadar a segunda etapa de competição. Graças a Deus ganhamos todas as provas e causamos boa impressão ao pessoal da cidade, que elogiou muito nosso desempenho. Após o almoço, embarcamos de volta a Santos, mortos de cansados.
Paulo Miorim 10/07/2020