A mão que afaga é a...
O ser humano está sempre querendo justiça, menos para suas injustiças. Gosta de aparentar ser o que não é ou jamais será e sente-se maior quando elogiado, bajulado.
Mas sempre tem uma pedra no caminho.
Fatos recentes e outros nem tanto, mas grudados na parede da memória é que nos levam a dialogar com a razão.
Um político brasileiro (ora condenado), ocupou a tribuna da Câmara tendo nas mãos uma revista semanal que denunciava desvio de conduta de um de seus adversários. O político não cansou de tecer loas a matéria.
Anos depois a história inverteu. Era ele o acusado. Novamente ocupou a tribuna para desmerecer a reportagem insultando a revista e os autores da revelação. “Revista de m...”, teria dito.
Quando um então juiz foi convidado para ser ministro da Justiça, recebeu os mais calorosos elogios e foi considerada a decisão mais acertada e inteligente de quem o convidou. O Brasil, enfim, seria outro. O tão aclamado juiz deixou o cargo. Hoje é odiado pelos mesmos que o endeusavam.
Um famoso apresentador de uma grande rede de televisão que, digamos, não compactua com a diretriz política, desabafou. “As mesmas pessoas que me aplaudiam três anos atrás por denunciar falcatruas políticas, hoje me atiram pedras, me ameaçam de morte”.
Quando o STF julga e condena adversários políticos, ele é o “guardião da democracia”. Quando age da mesma maneira com amigos “são todos vagabundos que deveriam serem presos”.
O título dessa crônica é um verso do soneto Versos Íntimos do poeta Augusto dos Anjos cujo primeiro terceto diz: “Toma um fósforo, acende seu cigarro! O beijo, amigo, é a véspera do escarro. A mão que afaga é a mesma que apedreja”.
E no último terceto: “Se alguém causa inda pena a sua chaga, apedreja essa mão que te afaga. Escarra nessa boca que te beija”.
Se vivesse nos dias atuais, quem sabe Augusto dos Anjos escrevesse:
“Escarra nessa boca que ‘tenta’ te beijar”.
Continuamos a remar para não beijar o asfalto quente com gosto de sangue. Os aplausos? Poupemos nossas mãos.