Viva Machado de Assis!
Quão grata foi a minha surpresa ao ver no jornal hoje cedo, enquanto tomava meu café, que a nova tradução em inglês do livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, do querido Machado de Assis, esgotou em um dia nos Estados Unidos. É realmente um feito impressionante para o nosso mais ilustre brasileiro.
Esse livro é incrível. Eu o li na adolescência, com 14 ou 15 anos – já faz tanto tempo. Sim, eu fui uma adolescente que lia clássicos da literatura nacional – Dos romances memoráveis de José de Alencar a verdadeira face da sociedade exposta por Aluísio Azevedo. O que posso fazer? Essa literatura sempre me inspirou, me intrigou, me acalentou.
A leitura desse livro me chacoalhou. Eu achei incrível o narrador do livro ser um defunto, sobretudo por usar da ironia para expor a hipocrisia da elite brasileira, pois nosso personagem central é um aristocrata e como já está morto mesmo, não tem medo de ser bastante sincero em seu relato. Eu posso facilmente recitar a dedicatória: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”.
Sim, sou uma grande fã de Machado de Assis. Por isso, eu penso que ele deveria ser mais valorizado em seu próprio país, assim como ganhou toda essa notoriedade nos Estados Unidos. Todavia, sei que isso se deve ao fato do momento em que se vive no país, em que o movimento Black Lives Matter chama a uma reflexão sobre o racismo, a importância da vida negra, o privilégio branco.
O que me lembra que até recentemente, eu, brasileira, não sabia que o maior autor da literatura nacional, que fundou a Academia Brasileira de Letras, que é um autor tão apreciado fora do Brasil, era negro. Sim, Machado de Assis era negro – e não só ele sofreu embranquecimento, muitos outros também, como eu descobri posteriormente.
Isso me entristece e envergonha por desconhecer a minha própria história. Mas me envergonha que entristece, por saber que o racismo no Brasil escondeu a verdadeira face dele por séculos. A foto mais reproduzida dele alterou seus traços, embranqueceu sua pele, rejeitou sua origem para que ele ganhasse reconhecimento. É uma mácula na nossa história. E não ajudou muito, já que lemos cada vez menos. Deveríamos ter orgulho de nossos autores. Deveria ser uma oportunidade de encorajar novos autores negros e não-negros. Mas nada está perdido. A história ainda pode ser mudada.
Voltando ao livro em questão, vale muito a pena sua leitura. O estilo machadiano de contar uma história é inconfundível. Ele faz uso de eufemismo e ironia para passar a sua mensagem, por isso esteja atento as entrelinhas. Super recomendo a leitura. Viva Machado de Assis!