Medos de outrora...
Medos de outrora...
O passado espreitou pela porta entreaberta. Deixo-me ir até ele, quase não o encontro. Quase oculto por sombras perambula acanhado. Há muito não se manifestava. Pegadas, poucas marcas, as vezes nem parece que estive lá. Porém, um dia fui criança...
Avisto a menina que sonhava com estrelas, falava com anjos, brincava na grama e se encolhia de medo - seu maior segredo... Quantas vezes ele a perseguiu... Era imenso! Confesso, quase a engoliu...
Em casa, em noites de lua cheia havia lobisomem, assombração, mula sem cabeça, bicho-papão. A avó dizia, não lia; uma tia recontava, a mãe atestava que vira. Na menina a imaginação crescia, crescia...Ouviu coisas, viu sombras nas matas, na moita. Aproveitavam o breu da noite, se moviam, amedrontavam. E a menina tremia, gelava, ficava petrificada. Medo domina, é cruel. Se monta, é carga pesada...
Na escola, o medo afastava as outras crianças - ela era “franzina” não dançava ciranda, não pulava corda, nada de pique-esconde, nada de roda. Na biblioteca se escondia – ali foi princesa, rainha, Rapunzel, foi fada madrinha, Gata borralheira. Navegou em caravelas e em barcos de papel, foi até ao céu... Ganhou batalhas, venceu bruxas, madrastas, monstros... E cresceu...
A infância se foi, o medo a seguiu pelo caminho. O vejo rondando, porém, não mais domina...
A porta se fecha, apenas espiava o passado por uma fresta...
Ema Machado