Eu preciso correr
Sete dias que ele vem aqui todos os dias. Fica até às 22h da noite e não perde a esperança de que eu vá aparecer, que eu vá até lá e pelo menos diga oi. Esperando pacientemente por mim. Mesmo que eu mande todo mundo dizê-lo que não quero falar com ninguém. Que não adianta ele ficar lá sentado na recepção.
Quando a enfermeira saí pela porta, no sétimo dia, eu desatino a chorar. Ele estava tentando falar comigo e eu só quero que ele desista de vir. Eu não quero falar com ele. Não quero ver ele. Não quero ouvir a voz dele. Eu só quero que ele vá embora e siga com a vida. Ele precisa correr, para longe, para um lugar distante e tranquilo. Porque um dia a Terra tremerá e ele precisa estar seguro. Eu só quero que ele fique seguro.
No entanto, dói imensamente saber que ele está lá. Que eu não posso me dar a liberdade de ir e conversar horas e horas com ele. Tudo que eu queria no momento era poder fazer isso. Tudo que eu preciso no momento é a companhia dele, do modo como ele me escuta, do modo como ele me trata como alguém relevante. Eu preciso dele, tanto quanto preciso de remédio para viver. Eu sinto falta dele.
Invejo cada casal que pode amar. Que pode simplesmente ter o luxo de conversar. Que não tem medo de nada, pois o amor sobrepõe qualquer coisa. Elas não sabem o quanto têm sorte, o poder de a universalidade de cada pequena emoção sentir, o poder de deixar-se abandonar nas mãos de quem for. E quanto tempo as pessoas perdem com pessoas erradas. Eu queria ter o tempo que elas estão perdendo.
Eu não posso deixar ele se apaixonar por mim. Vai doer um pouco, mas vai passar. Ele vai arrumar alguém saudável e será feliz dessa forma. Fará promessas eternas em um altar. Ele vai seguir em frente.
Procuro o meu pote do Descartes (esse que a minha irmã escreveu: penso, logo vomito) entre as minhas coisas e rapidamente coloco tudo para fora nele. Escuto o som da minha vida caindo pelo balde. A minha vida se perdendo aos poucos, despedaçando, se despedindo, dizendo um adeus silencioso. Ele está me esperando enquanto eu estou procurando um pedaço do céu. Enquanto eu estou dançando em cima do abismo.
Meu corpo cai como pena na cama; leve, fraco, esperando algum vento para ser movido para outro lugar.
Eu preciso correr, tem outro lugar esperando por mim. Mas, não consigo ir embora. Eu não sou capaz de qualquer movimento. Sou sempre coagida a ficar.
Alguém me leve pra casa.