Vai São João, vem São Pedro
Não era como um dia após o outro, tal qual o aparecimento da Lua, que antecede, pontualmente, todos os dias, o nascer do Sol. Estes são fenômenos naturais, extremamente necessários, ininterruptos, livres de que qualquer epidemia e sem os quais a vida não subsistiria. Há coisas que não merecem ser adjetivadas de “necessárias”, podem haver ou não haver; necessário é o “ar” que nos é impedido pelo coronavírus, especialmente àqueles que o procuram fora do isolamento, no frufru do mercado, no ruge-ruge dos coletivos. Atualmente, além de “ficar em casa”, seria necessário o remédio para combater o agressivo pandemônico vírus, mas a vacina não chega. Então as festas acontecem virtualmente, diferentes de outros tempos, ficamos em casa e separados, e ainda com muita precaução, quem não a teve hospitalizou-se, sem festa e com azafamado sufoco.
As coisas da cultura são motivadas por alguma necessidade e, de certa forma, bem relativas aos fatores físicos, biológicos e sociais, tudo obedecendo a esse relativismo cultural. Essas coisas mudam no decorrer do tempo, transformam-se sobretudo quando necessariamente precisam de adequações, deixando as velhas roupas para a História da Cultura, ao relato das antigas tradições. Já como objeto de estudo, sabemos dos costumes e das tradições em conversas com os avós, em crônicas como esta. Mas é no interior, onde ainda acontecem essas tradições, quando elas são mais valorizadas e preservadas. Recorro a Pilar, onde nasci e vivi meus primeiros sete anos de vida; depois a Itabaiana, quando vivenciei mais esses festejos juninos, ao iniciar com a festa de Santo Antônio. Em seguida, lá vinha São João para, depois, terminar com a de São Pedro. Sendo essas duas últimas as principais e de igual alegria.
Em Itabaiana, a festa de São João se caracterizava como a mais popular, com forrós, quadrilhas, fogueiras, comidas típicas, sobretudo de milho. Já na de São Pedro, por sua vez, havia milho, mas o baile não era forró; animava-se com uma orquestra de muitos instrumentos, vinda do Sul ou com a Orquestra de Fernando Borges, de Recife; bebidas chiques em mesas forradas com toalhas brancas e arranjos. Era uma festa “alinhada”, que em nada parecia com o santo homenageado, Simão Pedro, o rude pescador. Era uma festa casamenteira, quando namoravam as debutantes da sociedade local com a juventude vinda de outras cidades vizinhas, de outras capitais. No Itabaiana Clube só podia entrar quem estivesse de paletó e gravata. Nessa oportunidade, os “ricos” de Campina Grande ostentavam seus luxuosos automóveis na frente do Clube e as moças e os rapazes, entusiasmados por Santo Antônio, encontravam um descuido dos pais para “fugirem”, pelo escuro caminho daquela noite, sem consentimento e sem data do casamento.
Eram amores antigos, de noivados prolongados e, muitas vezes, cupido à primeira vista, mas já na iminência de sucumbirem a um violento amor, ao arrojo da paixão, como se estivessem suas almas mais quentes do que o corpo, que, como um vaso para transbordar, esperasse apenas uma pequena gota. E no inebriante baile de São Pedro, seus corpos, tais quais lenhas jogadas na fogueira, ardiam e fumegavam. Aquecidos, fugir era a vontade e a ação para se livrar do prazeroso incômodo. Já tinha ido São João, mas ali estavam a vez e a folgança de São Pedro.
DESTAQUE DA CRÔNICA : Mas é no interior, onde ainda acontecem essas tradições, quando elas são mais valorizadas e preservadas