UM PROFESSOR EM CRISE COM A TECNOLOGIA
Hoje mais calmo e recuperado, posso relatar o desespero que passei gravando um vídeo sobre conteúdos de minha disciplina, para meus alunos.
Primeiro informaram para usar o app zoom para gravar o vídeo, até aí tudo bem. Assim que abri o aplicativo no meu velho e lento notebook, vi uma quantidade de ícones e não sabia por onde começar. E pra dificultar ainda mais minha tarefa escolar, tudo em inglês. Como proceder e mudar o idioma para português, não fazia a menor ideia.
Clica aqui, clica ali, pronto: desmontei a plataforma. depois de várias tentativas, a mais próxima do acerto foi 100% de imagem e 0% de áudio. Mas como problemas e dificuldades são como uma segunda pele pra nós, insisti, insisti, até desistir de fazer o vídeo por ali. Tinha que existir outro meio.
Em meu desespero, passei a culpar governos e gestores passados e atuais, por tamanho descaso com a educação de nosso país e com seus profissionais, que muitas vezes têm que assumir o papel de pai, mãe, psicólogo, conselheiro e até de babá. Mesmo com tantas funções na escola são (mal) remunerados como um simples e inexpressível professor. Nunca tiveram uma visão de futuro, de investimento, em equipar as escolas com laboratórios de informática, capacitação dos professores, etc. Não que soubessem que este momento chegasse, mas porque esta é uma tendência já usada e no futuro, mais ainda. Pensei sobre companheiros meus, sem nenhuma intimidade com a internet. Alguns por resistência, outros por falta de incentivo mesmo. Pra desafogar a raiva que sentia, lembrei de outro culpado pelo que eu estava passando e abri minha caixa de ferramentas, disparando todo meu conhecimento de nomes feios contra o COVID-19. Toma vírus maldito! Xinguei mesmo.
Depois indicaram-me o Skype. Tudo conspirava pra aumentar meu pânico, se até a pronúncia deste era mais difícil, imagina lidar com ele. Porém, era meu dever e tinha que continuar tentando. Desta vez pelo celular e num é que consegui. Quer dizer, consegui entre aspas.
Quando me vi dentro do celular e iniciei a gravação, meus pés começaram a suar, os joelhos a tremer, as mãos não sabia se segurava os joelhos ou o queixo, se ajeitava os óculos. Bateu uma sensação de estar participando de um filme de terror, de ser um cego no meio do tiroteio nas favelas do Rio de Janeiro.
Novamente senti falta de uma capacitação, com ela, talvez tivesse suado menos, gaguejado menos, gesticulado menos. Enfim, tudo menos!
Antes de enviar o vídeo aos alunos, tive o cuidado de alertá-los que não prestassem muita atenção em mim, que ficassem atentos apenas ao conteúdo repassado e que de certa forma, acredito ter dado conta do recado. E que estava tudo bem comigo.
Energias recuperadas, o coração mais aliviado, decidi fazer uma caminhada e espairecer um pouco. Encontrei um conhecido e numa conversa informal, fiquei a relatar os fatos ocorridos até a conclusão do vídeo. Depois que terminei o relato, ele olhou-me com um olhar, não sei se de compaixão ou de tristeza com minha ignorância tecnológica e perguntou-me, se numa escala de 0 a 10, qual seria minha avaliação de atuação no vídeo. Claro que não respondi e mudei de assunto.
Tem gente que é maldosa, né!