A repercussão de um gif
Vivi no interior do Rio até os meus oito anos. Tive a oportunidade de participar de muitas festas folclóricas e vários tipos de manifestações culturais. Hoje, um simples gif de dança africana me arremessou no túnel do tempo e clareou minha memória afetiva.
Tanta coisa, por lá, eu tinha. O meu quintal era imenso. Tinha vários tipos de plantas, flores e árvores frutíferas. Eu parecia ter uma relação amistosa com cada uma delas. Tinha pé de mamão, manga espada, carambola, jambo; tinha também pé de pinha {fruta do conde). Eu simplesmente sentava sob as árvores e metia o bocão em uma fruta até me lambuzar inteirinha. Vez ou outra, chegava um moço em um burro com dois balaios cheios de jabuticaba. Era uma festa...
A cidade tinha um auto-falante. Eu costumava subir no pé de goiaba pra cantar com Dalva de Oliveira, Altemar Dutra... Minha paixão por música começou lá. Ainda lembro da cordialidade microfônica matutina, dos versos declamados e canções dedicadas; das portas abertas, da consideração em cada cumprimento nas ruas; dos pratinhos de broa de milho e chouriço, na janela, nem falo.
Eu sou da Vila de São José de Ubá. Terra do tomate, onde grampo de cabelo tinha o nome de besteirinha. Graças a tantas diversidades de nomes, como este, sofri muito bulling na escola. O meu jeitinho brejeiro e o sotaque também não foram bem recebidos. Com o tempo, perdi, adquiri e até mantive hábitos culturais, mas as correntes do Rio de Janeiro me arrastaram e me transformaram de uma forma implacável. Nem uma fotografia na parede da minha cidadezinha, eu tenho. Me afoguei nessa linda capital do Rio, e apesar de tanta criminalidade e canalhice, ainda não tem nenhuma rodoviária ou aeroporto que possam me tirar daqui.