Balançando São João na rede  

          O sinal de que o São João  se avizinhava era o milho verde. Na mão das crianças, da palha transformada em roupa; do cabelo das espigas espichado nas bonecas; até mesmo dos grãos sendo o gado; e dos sabugos, o curral. Sinal do tempo e dos homens do campo, trazendo, nas costas, as “mãos” de milho, ensacadas para entregá-las aos feirantes. É difícil acabar o liame ou separar o milho das festas juninas. Sempre  combati os , às vezes, chamados “São João fora de época”. É óbvio e muito claro que, na nossa Cultura, genuinamente, o São João é uma festa sazonal. Ouvi muito, quando se falava em falta de chuva: “será um São João sem milho, a seca está braba”. Havia São João, e se havia festa, havia pouco, mas havia milho...
          Atualmente choveu o suficiente para regar a lavoura; as tanajuras desceram nas nossas calçadas, nos nossos jardins, e o milho veio do campo para a cidade. Mas, também voou até nós o quase invisível e  terrível coronavírus, que nos amedrontou, isolou-nos em casa, sem podermos comprar milho no mercado, onde, lá está aos montes. Em distância de desconfiança, escondendo a boca e o nariz por trás da máscara, poderemos ir ao supermercado, esperar a nossa vez, e rapidamente comprar as espigas desnudas, empacotadas em bandeja de isopor e cobertas em plástico transparente. É até prático, talvez, mas não é poético, tampouco cultural, contrariando a carroça das nossas tradições. De modo que, se alguém falasse em “São João na rede”, de pronto, perguntar-se-ia: - Oxente, já vai dormir? Embora que essa “rede” já tenha sido muito esticada pelos punhos para decorações, agora, na verdade, noutro sentido, está bem usada na quarentena, nesse isolamento social, como um tipo de comunicação, a que nos obriga a peste do coronavírus, “bicho” que nos submeteu a nos reunir em outro tipo de rede, que suporta milhões de mocotós, não somente de quatro mocotós como é a do meu terraço...
          Há milho? Então podemos encomendar, por internet, todas as iguarias juninas: milho cozinhado, assado, canjica, pamonha, bolo de milho, cuscuz, e outras coisas não provenientes das espigas, como pés de moleque, queijo de manteiga, do coalho e gostosas cocadas, tão características dessa época. Luiz Gonzaga cantou, Sivuca tocou “São João do Carneirinho, fale lá com São José para ele me ajudar, peça pra meu milho dar vinte espigas em cada pé”. Choveu. O milho deu vinte espigas em cada pé. Mas, de casa não arredamos o pé para pegar esse milho. Contudo, se há milho, haverá “São João na rede”, o que promove o João que governa o Estado, para não deixar, mesmo diante de imensas dificuldades e transtornos, que o São João desapareça. Ontem, o Governador abriu esse “São João na rede”, que sempre aconteceu nas ruas da cidade, para, também hoje, ocorrer no aconchego da sua casa, da sua rede. Se você quiser, caro leitor, poderá cantar, dançar, durante esse marco da política cultural, na Paraíba, dentro das comemorações dos “90 Anos de Sivuca”, que se estenderão durante este ano de 2020. Ligue-se no “São João na rede”, que está no ar desde ontem até as derradeiras horas de hoje. Poderá ser considerado o “maior São João do mundo” por ser visto e ouvido, da China ou do Japão à Paraíba; do Polo Norte ao Polo Sul. Tradição cultural é coisa muito forte, quanto mais se propaga, mais sobrevive...


DESTAQUE : Tradição cultural é coisa muito forte, quanto mais se propaga, mais sobrevive...