Mensagem de voz
Já faz um tempo que as pessoas não utilizam mais o telefone para uma conversa espontânea. A forma costumeira tem sido mensagem de voz via aplicativo. Eu, pessoalmente, não gosto muito deste recurso, até utilizo às vezes, mas há quem use de forma mais corriqueira, há quem converse via mensagem de voz. Cada um grava sua mensagem, o outro ouve e depois responde da mesma forma. É fato que perde a espontaneidade, a surpresa repentina causada por uma interrupção na fala do outro, fato que ocorre na ligação de telefone.
Os prejuízos causados por esta maneira de conversar podem ser enormes. Prejuízos? Não vou colocar a questão econômica, não é a minha intenção, mas devem-se considerar perdas para o imaginário popular, o repertório para criação de roteiros de telenovelas, filmes e afins. Imagine só não termos mais: declarações de amor repentinas, notícias que surgem de repente no meio da ligação que muda toda a conversa e também não se pode esquecer daquele ato mal-educado de desligar na cara, pois muitas vezes as pessoas brigavam por telefone, ofendiam-se e alguém desligava na cara. Ainda haveria outros exemplos de situações que podem ocorrer numa ligação telefônica, mas vou poupá-los e não fazer igual certas pessoas que gravam mensagens de voz de cinco minutos ou até mais.
Antes que eu esqueça: mencionei filme logo acima e pergunto: quem nunca viu cenas de pessoas deixando uma longa mensagem para a secretária eletrônica? Na esperança de que quando a pessoa chegasse para escutar a mensagem ou acontecia de atender no meio da mensagem ou muitas vezes a pessoa do outro lado está ouvindo mas não quer atender. Já se tratava de um prenúncio da era atual? Algumas mensagens eram longas, imagine que secretaria eletrônica ganhasse vida e dissesse: Eu te entendo, ou, eu estou te ouvindo, mas não sei alguém mais vai ouvir.
As pessoas que utilizam mensagens de voz para uma conversa voix-à-voix (voz a voz em francês, inspirado na expressão têtê-à-tête) podem cair na armadilha de uma pessoa enviar uma mensagem de voz e a outra não responder naquele mesmo instante e vir a responder duzentos anos depois, perdão, vinte minutos depois, afinal o tempo que se passa esperando pela resposta do outro pode aparentar um tempo enorme. Tempo depois a outra pessoa ouve a mensagem, responde, mas pode ser tarde, afinal muita coisa pode acontecer entre uma mensagem e outra. Eis uma desvantagem. Por outro lado reconheço algumas vantagens, do tipo: você quer falar com a pessoa de uma maneira mais íntima do que escrever em texto, mas não quer ligar para não pegar o outro de surpresa, então envia uma mensagem de voz. Exemplo: È fim de semana, o marido, esposa e as crianças, bate aquela vontade do casal sair a sós, por isto deixar as crianças com uma das avós, nada melhor do que deixar uma mensagem de voz assim:
_ Bom dia, está tudo bem? Pois então você não gostaria de ficar um tempinho com seus netinhos, eles estão morrendo de saudades, querem brincar aí, beijos, tchau.
Devo admitir que uma conversa como essa não seria possível por telefone. A avó do outro lado talvez não esteja disponível ou não disposta a receber visita dos adoráveis netos, e então ela pode responder por mensagem de voz de uma maneira muito educada, algo que por ligação a deixaria constrangida a aceitar.
Seja a conversa por telefone ou gravada sempre estará sujeita à dúvida da expressão de quem está ouvindo ou falando. Não se sabe se a voz corresponde ao que realmente está acontecendo do outro lado. Inventaram a conversa por vídeo, que também tem se tornado muito comum e é o tipo de conversa que não dá para dizer: Hoje eu não posso te receber, estou arrumando e limpando a casa, só que a câmera mostra o lugar mais desejado para se morar naquele momento.
Nestes tempos de distanciamento social ajuda bastante estas novas formas de comunicação, mas ai já é assunto para outro texto.
18/06/2020