Dia dos Namorados
Diante da proximidade de uma data tão importante para a humanidade, o dia dos namorados, na verdade, oportunidade mesmo para se lembrar de exercitar o amor entre, pelo menos, dois seres (já que o mundo vive cuspindo bala), resolvi quebrar o jejum das minhas postagens e compartilhar aqui um pouco desse sentimento maior que, apesar do desalinho de algumas consciências, ainda poderá operar milagres se cultivado entre homens e mulheres de boa-fé.
O verbo namorar é bem simples, pede ação direta; você não precisa de outra pessoa para praticá-lo — sozinho você pode escolher entre, por exemplo, namorar o Universo, ou simplesmente a pessoa ao lado —, basta que desenvolva a capacidade de amar.
Mas eu não vim até aqui, entretanto, trazer lição de vida; antes o meu desejo seria o de que a energia desse texto fosse capaz de voar para bem longe, alcançando países distantes, e que em um desses países distantes houvesse uma pequena cidade de casas humildes e com madrugadas bastante frias, e que em uma de suas casas humildes construídas no alto de uma montanha, onde o acesso fosse penoso, morasse um casal de velhinhos, e que naquele quarto modesto e com pouco aquecimento estivessem os dois dormindo na posição de conchinha, com um único lençol fino e curto, e que na madrugada o velhinho despertasse e dissesse mulher, acorda, vamos namorar, hoje é dia dos namorados!
E que de repente aquela senhora de idade avançada levantasse da cama com um brilho de debutante nos olhos e simplesmente dissesse: vamos! Que os dois descessem aquela montanha com muita dificuldade, por conta das trilhas escorregadias e da pouca iluminação do horário, mas que finalmente chegassem ao raiar do dia de mãos dadas ao pé da montanha, quando então fossem logo colhendo flores do campo e seguissem em direção ao centro da cidade e começassem a bater na porta daquelas outras pessoas, que perguntariam, naturalmente, quem é — é o amor, responderiam os dois a uma só voz, e que as pessoas abrissem a porta de suas casas com cara de feliz e que fossem logo se juntando àquele grupo de casais de mãos dadas que não parava de crescer.
Que essa história, com uma providencial ajuda da energia do amor daquelas pessoas, adquirisse uma conotação metafísica, ao ponto de fazer brotar salamandras gigantes e cavalos alados das entranhas da terra para conduzir todos que iriam levar a felicidade para além do horizonte.
Que montados nesses animais, percorrendo caminhos pela terra ou pelo ar, como em uma progressão geométrica fantástica, rapidamente alcançando todas as cidades, todos os países todos os continentes, que enfim, esses casais apaixonados se comunicassem com todo o mundo, disseminando a linguagem universal do amor.
Que esse amor bárbaro, seguido por aquela legião de aficionados, conseguisse realizar a proeza de inverter a ordem do tempo e invadir o playground das nossas existências, estabelecendo as regras do pega-pega, inoculando-nos uma jovialidade mental mais ou menos com uma desenvoltura idêntica à daquele casal de crianças ali que não me é estranho.