Ontem no Trem - Dona Menina
Ontem no trem / Dona Menina
Embarco na estação Campo grande e vou em pé para variar, mas feliz por está curtindo um geladinho. Lá fora um calor carioca infernal e aqui dentro o clima é quase glacial
Senhoras conversando ao meu lado, parecendo ter mais de 65 anos, estavam elogiando o conforto e a modernidade do trem e relembrando histórias de quase terror dos tempos passado. Uma dizia que quase todo dia entrava pela janela do trem na Central e a outra que com frequência andava nos trilhos quando o trem parava no meio do nada...
Pensei de forma mordaz que elas só estavam todas alegrinhas e falavam isso porque era 1 hora da tarde e não 5 horas! E que esse amor todo iria acabar rapidinho quando as lindas senhoras fossem impedidas de desembarcarem em suas estações pela imobilidade temporária, quando praticassem apneia por alguns instantes ou contorcionismo...
Brincadeira a parte, não vivi nesta época, mas depoimentos de pessoas mais velhas afirmam que houve uma tremenda evolução dos trens carioca. Fico Imaginando como era antes!
Pois bem, umas dessas senhoras pra lá de sexagenária, piauiense, baixinha, magrinha, morena, falante, sorridente e extremamente simpática se chama Dona Menina.
Dona Menina dizia de forma alegre que o seu maior prazer sempre foi alimentar os outros. Contava que muitas vezes passou perto de construção de prédios ou de estradas e perguntava ao encarregado se os trabalhadores podiam parar para tomar café. Daí ela distribuía café com pão para turma e segundo ela, sempre “com muito gosto” e que não tinha coragem de negar o pão para ninguém. Que sempre deixa numa bolsinha separada o lanche dos quatro trabalhadores que recolhem o lixo de sua rua. Que nunca fora rica, mas que sempre repartia o que tinha e com isso ganhou muitos amigos e todos a conhecia no seu bairro...
Prosseguia dizendo que não tinha filho, morava com seu esposo numa casa com um grande quintal que plantava de tudo: jabuticaba, laranja, manga, cajá, muitas flores etc. Tinha também galinhas e que do portão gritava: ”Cadê as neguinhas da mamãe?” Todas vinham ao seu encontro. Falou com imenso carinho do Escube, seu cachorro muito “atendido”, melhor do que muita gente, que gostava de picolé e que era seu grande amigo.
Contagiou-nos tanto com sua alegria que até alguns jovens que estavam próximos passaram a participar da conversa e sorrir de forma admirada.
Dona menina falando e falando e eu imaginando a rica vida dessa senhora simples e generosa que alegrou meu dia no trem!
Encantada. Vontade de levar Dona Menina pra mim!
“Há pessoas que transformam o sol numa simples mancha amarela, mas há aquelas que fazem de uma simples mancha amarela o próprio sol.”Pablo Picasso