Uma cadelinha muito legal
1. Eu disse em outras crônicas que, embora passarinheiro - e criei muitos - tivera sob minha tutela e meus cuidados dois fidelíssimos cachorros; um Dobermann e um Pastor alemão. Adotava-os para agradar meus filhos, Paulo Fernando e Adriano, meninotes. Os dois adoravam brincar com cachorros; de raça e vira-latas.
2. Nenhum dos meus filhos, como o pai, deslumbrava-se com o arrulho de meigas rolinhas fogo-apagou; com a dança encantadora e colorida dos beija-flores; ou acolhia, com prazer, os bem-te-vis pousando, ao cair da tarde, no meu flamboyant frondoso, querendo um galho como agasalho seguro para o pernoite.
3. Nunca, porém, menosprezei os cães, por mais modestos que fossem. Nunca os enxotei de minha casa sob o argumento de poder vir a ser incomodado por seus latidos fora de hora.
Só que, ao invés do "au-au-au" de um cão estressado, preferia o canto doce e harmonioso de um sabiá ou de um curió, pássaros especiais, comprados, às escondidas, na mão do seu Joaquim, de saudosa memória.
4. O Dobermann morreu, de repente, - pasmem! - numa segunda-feira de carnaval e, para agravar, em Salvador. Tive que enterrá-lo ouvindo o som estridente de alguns trio-elétricos; esses monstros sonoros que ensurdecem o soteropolitano na festa de Momo. Preferia tê-lo enterrado ouvindo uma marcha fúnebre; a Sonata-2 de Frédéric Chopin, por exemplo.
5. O Pastor alemão, muito arisco, fujão, teve morte trágica: foi esmagado pelas rodas assassinas de um carro em uma rua de Salvador. Ele, no seu macio e cadenciado trote, rabinho balançando, volta para sua casa; para nossa casa. Marquez era o seu nome. Foi muito pranteado porque fiel aos seus donos até morrer.
6. Dia desses, abrindo, por acaso, álbuns que guardam a história da minha família, deparei-me com uma foto, arranhada pelo tempo, do elegante Dobermann brincando com meus filhos. Senti saudade dele; e do árdego Pastor Marquez, tmbém.
7. Fui às minhas estantes, e retirei de uma delas um livrinho que fala de cachorros célebres. Adquirira esse livro - "100 cães que mudaram a civilização - Os cães mais influentes da história" - faz muito tempo, num sebo de São Paulo. Seu autor: o norte-americano Sam Stall, escritor. Fazia anos que não o foliava. Interessante: esse tal de "fique em casa" tem me dado a oportunidade de me reencontrar com velhos e bons livros.
8. Cem cães. Calma! Não falarei sobre todos eles. Seria exigir demais do meu paciente leitor. Mas bem que podia re-contar, sacando do livro de Stall, a história do Péritas, "o cachorro que salvou Alexandre, o Grande"; recontar a história do RinTin Tin; do Grigio, o misterioso cachorro de São Dom Bosco; e até da cadela Laika, o primeiro animal a conquistar o espaço sideral.
9. Terminaria cansando o meu dileto leitor. Embora, ache, sinceramente, que escrever ou falar sobre animais nunca é enfadonho. Falar sobre o dono, talvez, seja mais traumático. Estarei mentindo?
10. Decidi re-contar a história da cadelinha pug Fortune, "o cão que separou o casal Bonaparte-Josephine". Acredite se quiser. E vamos lá.
Após a Revolução Francesa, Marie-Josephe-Rose, aristocráta francesa, foi presa com seu marido, o senhor Alexandre Beuharnais. Alexandre não escapou da guilhotina; Rose, sim. Permanecendo na prisão, ela recebia poucas visitas. Só a pug Fortune tinha acesso fácil à prisioneira, sua dileta amiga.
Driblando a vigilância dos carcereiros, Fortune funcionava como mensageira de Rose, levando e trazendo, "sob a coleira de veludo", bilhetes e cartas dos amigos de sua dona.
Rose foi libertada e no dia 9 de março de 1796 casou com Napoleão Bonaparte, que preferia chamar sua amada de Josephine.
Na noite de núpcias, um problemão. Fortune, que dividia a cama com Rose, não permitiu que Napoleão ocupasse o mesmo leito. O Imperador não contou com a adesão de Josephine que teria dito: "Se ela não dormir em nossa cama, eu também não durmo".
Bonaparte tentou um acordo com a cadela, pondo-a nos seus braçõs. Como resposta, recebeu um mordida. A cicatriz, ele carregou pela vida afora. E conclue o escritor Sam Stall: "Foi assim que o grande conquistador acabou derrotado em seu próprio quarto". Fake News? Lenda?
11. Quando escrevo sobre cachorros, recordo-me inevitavelmente desses versos inteligentes e ferinos do poeta mineiro Belmiro Braga (1872-1937) - "Pela estrada da vida subi morros, / desci ladeiras e, afinal, te digo: / se entre os amigos encontrei cachorros, / entre os cachorros encontrei-te, amigo!"
Voltarei à bordo de novas crônicas...escrevendo sobre gente, e, com imenso prazer, sobre animais...
1. Eu disse em outras crônicas que, embora passarinheiro - e criei muitos - tivera sob minha tutela e meus cuidados dois fidelíssimos cachorros; um Dobermann e um Pastor alemão. Adotava-os para agradar meus filhos, Paulo Fernando e Adriano, meninotes. Os dois adoravam brincar com cachorros; de raça e vira-latas.
2. Nenhum dos meus filhos, como o pai, deslumbrava-se com o arrulho de meigas rolinhas fogo-apagou; com a dança encantadora e colorida dos beija-flores; ou acolhia, com prazer, os bem-te-vis pousando, ao cair da tarde, no meu flamboyant frondoso, querendo um galho como agasalho seguro para o pernoite.
3. Nunca, porém, menosprezei os cães, por mais modestos que fossem. Nunca os enxotei de minha casa sob o argumento de poder vir a ser incomodado por seus latidos fora de hora.
Só que, ao invés do "au-au-au" de um cão estressado, preferia o canto doce e harmonioso de um sabiá ou de um curió, pássaros especiais, comprados, às escondidas, na mão do seu Joaquim, de saudosa memória.
4. O Dobermann morreu, de repente, - pasmem! - numa segunda-feira de carnaval e, para agravar, em Salvador. Tive que enterrá-lo ouvindo o som estridente de alguns trio-elétricos; esses monstros sonoros que ensurdecem o soteropolitano na festa de Momo. Preferia tê-lo enterrado ouvindo uma marcha fúnebre; a Sonata-2 de Frédéric Chopin, por exemplo.
5. O Pastor alemão, muito arisco, fujão, teve morte trágica: foi esmagado pelas rodas assassinas de um carro em uma rua de Salvador. Ele, no seu macio e cadenciado trote, rabinho balançando, volta para sua casa; para nossa casa. Marquez era o seu nome. Foi muito pranteado porque fiel aos seus donos até morrer.
6. Dia desses, abrindo, por acaso, álbuns que guardam a história da minha família, deparei-me com uma foto, arranhada pelo tempo, do elegante Dobermann brincando com meus filhos. Senti saudade dele; e do árdego Pastor Marquez, tmbém.
7. Fui às minhas estantes, e retirei de uma delas um livrinho que fala de cachorros célebres. Adquirira esse livro - "100 cães que mudaram a civilização - Os cães mais influentes da história" - faz muito tempo, num sebo de São Paulo. Seu autor: o norte-americano Sam Stall, escritor. Fazia anos que não o foliava. Interessante: esse tal de "fique em casa" tem me dado a oportunidade de me reencontrar com velhos e bons livros.
8. Cem cães. Calma! Não falarei sobre todos eles. Seria exigir demais do meu paciente leitor. Mas bem que podia re-contar, sacando do livro de Stall, a história do Péritas, "o cachorro que salvou Alexandre, o Grande"; recontar a história do RinTin Tin; do Grigio, o misterioso cachorro de São Dom Bosco; e até da cadela Laika, o primeiro animal a conquistar o espaço sideral.
9. Terminaria cansando o meu dileto leitor. Embora, ache, sinceramente, que escrever ou falar sobre animais nunca é enfadonho. Falar sobre o dono, talvez, seja mais traumático. Estarei mentindo?
10. Decidi re-contar a história da cadelinha pug Fortune, "o cão que separou o casal Bonaparte-Josephine". Acredite se quiser. E vamos lá.
Após a Revolução Francesa, Marie-Josephe-Rose, aristocráta francesa, foi presa com seu marido, o senhor Alexandre Beuharnais. Alexandre não escapou da guilhotina; Rose, sim. Permanecendo na prisão, ela recebia poucas visitas. Só a pug Fortune tinha acesso fácil à prisioneira, sua dileta amiga.
Driblando a vigilância dos carcereiros, Fortune funcionava como mensageira de Rose, levando e trazendo, "sob a coleira de veludo", bilhetes e cartas dos amigos de sua dona.
Rose foi libertada e no dia 9 de março de 1796 casou com Napoleão Bonaparte, que preferia chamar sua amada de Josephine.
Na noite de núpcias, um problemão. Fortune, que dividia a cama com Rose, não permitiu que Napoleão ocupasse o mesmo leito. O Imperador não contou com a adesão de Josephine que teria dito: "Se ela não dormir em nossa cama, eu também não durmo".
Bonaparte tentou um acordo com a cadela, pondo-a nos seus braçõs. Como resposta, recebeu um mordida. A cicatriz, ele carregou pela vida afora. E conclue o escritor Sam Stall: "Foi assim que o grande conquistador acabou derrotado em seu próprio quarto". Fake News? Lenda?
11. Quando escrevo sobre cachorros, recordo-me inevitavelmente desses versos inteligentes e ferinos do poeta mineiro Belmiro Braga (1872-1937) - "Pela estrada da vida subi morros, / desci ladeiras e, afinal, te digo: / se entre os amigos encontrei cachorros, / entre os cachorros encontrei-te, amigo!"
Voltarei à bordo de novas crônicas...escrevendo sobre gente, e, com imenso prazer, sobre animais...