Juazeiro
Quatro anos vagando feito alma penada; jogada na estrada para Juazeiro; cumprido uma espécie de sentença; e todos os dias é um desespero. Sem a família, longe dos filhos; os olhos são muitos dengosos, logo perdem o brilho.
As orquídeas, rosas do deserto, rosas de outras espécies, e um beija-flor namorador. Todos os dias flerta com as flores e dança para a cuidadora do jardim. As borboletas são atrevidas, graciosas e cheias de cores, desfilam ao som do bandolim.
São as únicas companhias de uma triste joaninha. Um trabalho perigoso e estressante; roubo, morte e prisão; uma arma na mão. Um coração aflito bate descompassado pelo seu lampião. Não sei como ele consegue ter dupla personalidade. O combate o deixa duro e frio. Fora da farda, é um garotinho assustado.
Assustada e descompensada de ver todos os dias o caos da vida. Mora em Salvador, dispõe de bons recursos, mas foi no sertão baiano que perdeu a inocência. Viu a cara da fome, pobreza ao extremo, e gente que não come. Lá o tráfico é pesado, não tem aterro sanitário, o esgoto corre a céu aberto; muriçocas e moscas; cabras e bodes; mandacaru e palmas; seca, poeira e morte.
Nesse cenário, ela se perdeu, não sabe se chora de saudades pelos seus ou vive com joelho pregado na cruz; clamando por Jesus, Padre Cicero e todos os Santos. É muita gente morrendo de fome, e o estado nem sabe os nomes. Ela, indignada com tamanha pobreza, olha a sua mesa e imagina o quanto tem sorte.
Resolveu abrir as mãos, esquecer a solidão e afagar um pobre coração. Dois meses sem abraçar a família, hoje, foi para a terra amada. Acabou de chegar, é longa a viagem, 7h na estrada. Pela janela do quarto, o céu parece um quadro emoldurado em sua parede. O vento gostoso é seu vizinho, um bioma de flores e árvores nativas é o seu jardim secreto. Respira um ar frio, e num colchão macio tenta esquecer Juazeiro.