CHICO DA BOMBA: A LENDA

Outubro é mês de festa em João Câmara (RN), local onde nasci, porque a cidade comemora 79 anos de emancipação política. A data reúne antigos moradores vindos de todas as partes do Brasil, para rever amigos e receber as homenagens comuns nesta ocasião, em que a população residente na cidade transborda de alegria.

Encravada na região do Mato Grande e localizada a 70 quilômetros de Natal, o município, que até meados de 50 era conhecida como Baixa-Verde mudou seu nome para João Câmara, a fim de homenagear o primeiro prefeito da localidade: João Severiano da Câmara.

Contando com uma população estimada em pouco mais de 30 mil habitantes, João Câmara, uma típica cidade do interior notabilizou-se na década de 80, quando teve sua tranqüilidade abalada por vários terremotos. Por esse motivo passou a figurar no Guiness Book – O Livro dos Records – devido ao grande número de abalos sísmicos registrados em um único dia. O tempo se encarregou de fazer o povo esquecer a trágica lembrança, ou pelo menos conviver com ela sem grandes traumas. As histórias fantásticas criadas a partir deste episódio e antes dele, porém, permanecem vivas na memória popular.

A cidade, aliás, também é conhecida pela infinidade de personagens e contadores de histórias sempre relembradas pelo povo e entre os personagens mais cantados em prosa e verso destacam-se nomes como Sebastião Dodô, Lelé e Chico da Bomba, ex-prefeito da cidade, uma verdadeira lenda para os moradores da região.

A simplicidade ingênua de Chico da Bomba, o levou a protagonizar várias situações, gravadas até hoje na memória do povo camarense. Motorista pobre e analfabeto, ele surpreendeu a todos quando decidiu disputar a prefeitura do município com políticos tradicionais e detentores de farto poder econômico. O carisma de Chico da Bomba o elegeu com uma maioria estimada em mais de mil votos e o deixou na prefeitura por dois mandatos e ainda elegeu seu sucessor.

A campanha política que o elegeu foi muito disputada. Os opositores de Chico contavam com o apoio de grandes líderes políticos do Estado, entre os quais o deputado Magnus Kelly, que provocava o prefeito chamando-o de Chico Traque. A resposta não tardava. Chico da Bomba não sabia pronunciar o nome do deputado e o apelidou de “Matusquele”.

Os comícios quebravam a rotina pacata da cidade e todos os moradores saíam de suas casas para ouvir as “rinhas verbais” dos dois políticos. Em certa ocasião, Magnus Kelly insinuou que Chico da Bomba mantinha duas mulheres. Uma, a sua esposa residente em João Câmara, a quem ele chamou de “matriz”. A outra, a “filial”, uma amante que residia em Natal. Kelly chamou as duas de Socic – numa referência a uma rede de lojas de eletrodomésticos, que mantinha uma sucursal na cidade.

A população ficou em polvorosa esperando a resposta de Chico da Bomba, que não se fez de rogado. À noite, no comício, dizendo-se muito ofendido com a alusão feita pelo adversário, ele disparou: “Eu tenho somente uma mulher – minha esposa; mãe dos meus filhos. A Socic de lá, a qual o deputado se referiu, é a mãe dele, a quem eu mantenho com casa, comida, ventilador e ferro elétrico comprado na Socic”. O povo vibrava com as respostas.

Em outra ocasião, um grupo de alunos do Ginásio João XXIII organizou uma charanga para assistir a um comício de Chico da Bomba. Um dos integrantes levou um chocalho, cujo barulho era ensurdecedor. Chico falava, o povo aplaudia e a charanga acompanhava os aplausos tocando. O rapaz do chocalho também acompanhava as palmas, badalando o chocalho. Chico da Bomba não gostou muito do barulho e dirigiu-se ao público dizendo: “Por favor, se alguém conhece a mãe deste rapaz, avise que ela está sendo procurada pelo filho”.

Os mais antigos também contam, que ao assumir a prefeitura Chico da Bomba ficou muito impressionado com o valor da folha de pagamento e mandou chamar o secretário de finanças para explicar quem era o servidor chamado Total, que recebia um salário superior ao dele.