THIS MASQUERADE

Mais uma vez, sem ter o que fazer, meus miolos voltaram ao passado para revolver coisas e adaptá-las ao presente. Assim lembrei-me de que, quando menino, minha tia gostava muito de ouvir discos, aqueles de setenta e oito rotações, numa vitrola RCA-Victor que tinha, no logotipo, a figura de um cachorrinho olhando para um gramofone como se estivesse reconhecendo, ali, “A Voz do Dono”. Vivendo naquele ambiente a música passou a fazer parte, também, das minhas preferências na vida adulta.

Já por volta dos anos setenta eu era bem grandinho e tinha uma discoteca integrada por discos de vinil, conhecidos como “long-play”. Com eles a reprodução se fazia através de uma “rádio-vitrola” utilizando, nas trilhas, agulha permanente de diamante e cápsulas de cristal.

Dentre as músicas da minha preferência lembro-me de uma que inspirou esse texto. Na época, lá pelas bandas dos anos setenta, um dos sucessos era “Masquerade”, na voz do próprio autor, Leon Russel, um americano com a sensibilidade à flor da pele. Suas apresentações eram claríssimas nas expressões da voz, nos gestos e nos toques ao piano que os leitores podem apreciar nessa gravação do YouTube:(https://www.youtube.com/watch?v=WVtYNbFAxrY).

Particularmente, o que diz a letra não importa muito, em nossa crônica, mas fala de um casal que insiste em viver através da utilização de disfarces e tomadas fugazes de posição em mútua e permanente enganação. O título, sim! Esse nos é bastante significativo, pois nos coloca diante da nossa realidade atual, a máscara.

A partir de então, podemos seguir três roteiros paralelos. O primeiro, a máscara que boa parte dos nossos congressistas e autoridades públicas utilizam para enganar, corromper, desviar, falsear, surrupiar, ocultar e tantas outras atitudes nocivas ao país e ao seu povo.

A segunda a máscara que oculta a traiçoeira atividade de parte da mídia, “na formação da opinião pública”, através da insistente difusão de conteúdo falso ou tendencioso, unicamente interessada em induzir o comportamento social com fundamentação ideológica.

A terceira é a que diz respeito à transformação por que passa a nossa própria imagem diante do anteparo que colocamos, no rosto, como suposta salvaguarda contra a contaminação pandêmica.

A partir de então, não vemos mais os rostos das pessoas e as pessoas não vêem mais os nossos rostos. Não vemos mais sorrisos, nem os esgares faciais que ocorrem dos olhos para baixo. Em boa parte das vezes, quando existe conversa, as expressões antes convencionais já resvalaram para a invisibilidade ou para a suposição.

Nossos olhares perderam o contato com expressões faciais que fazem parte integrante das nossas comunicações interpessoais. Sinais de alegria, tristeza, apreensão, desconfiança, ternura, afinidade, anseios... Da mesma forma, não vemos mais a beleza dos lábios femininos e nem podemos saber se estão ou não pintados!

Afinal o quê significará, em nossa vida futura, a convivência obrigatória com gente mascarada, tanto nos estamentos oficias, na manipulação midiática ou em nossa vivência interpessoal ou coletiva?

Embora não tendo fórmulas não ficam muito difíceis, nas ilações, vislumbrar um futuro comportamental bastante diferente daquele com o qual vínhamos convivendo. Enquanto isso fiquemos com a nova mensagem que a música de Leon Russel pode nos sugerir e aguardemos o dia em que, em todas as alternativas, seja possível remover as máscaras...

Amelius
Enviado por Amelius em 29/04/2020
Reeditado em 29/04/2020
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