– E daí?

Quando Achille Mbembe conceituou necropolítica para definir as formas contemporâneas que subjugam a vida ao poder da morte exercida pelos regimes governamentais do século XXI não deve ter imaginado o quanto a noção de necropoder caberia ao atual presidente desta nação. Mas, depois da preocupação com o aumento de mortes decorrentes de COVID-19 no país, demonstrada pelo chefe do executivo ficou visível como as águas turvas do esgoto que ele dissemina em suas falas.

O cidadão que hoje ocupa o cargo mais importante do executivo nacional alçou ao poder travestido de mito, que nos transporta para a antiguidade clássica em que as narrativas gregas explicavam os fatos da realidade e fenômenos da natureza, em uma eleição marcada pela ação das Fake News determinando seu desfecho. E como mito, promoveu o negacionismo como forma de escapar das verdades que lhe são desconfortáveis como a que atesta sua clara incompetência em gerir esta nação.

Para os ditos cristãos que promovem a imagem de um Jesus miliciano fazendo arminha nas redes sociais e dando as costas ao seu próximo sinto pelas contas que eles terão de prestar daqui a algum tempo. Afinal, a resposta daquele galileu diante do ladrão na cruz destoa muito da frase propagada como mantra por essas pessoas revelando o grau de amor que nutrem pelos seus semelhantes: “– Bandido bom é bandido morto”. Com uma pequena ressalva: “– Desde que não seja filho meu”.

Se toda vida importa me pergunto mais uma vez: “– Quanto vale a vida?” Diante da atual situação em que a capital paraense e muitas outras se encontram chegando à exaustão total do sistema de saúde pública e privada. Minha preocupação redobra quando penso nos profissionais dos serviços essenciais que driblam a morte todo dia, quando não são alvejados na linha de frente desse combate. O mais triste é saber que eles também são vitimas do preconceito sofrendo retaliações e agressões de pessoas insensíveis e sem amor ao próximo.

Mas, e daí se as pessoas estão morrendo nas UTIs, corredores de hospitais e em plena rua ou dentro de casa por falta de leitos? E daí se os mortos estão aumentando exponencialmente e sendo enterrados em covas coletivas sem direito a velório nem despedida formal? E daí se os profissionais da saúde estão começando a ter que escolher quem tem direito a respiradores como uma clara expressão da necropolítica em nosso meio? E daí quando isso acontecer com você?