FARPAS DE NESTOR TANGERINI

FARPAS DE NESTOR TANGERINI

[ENDEREÇADAS AO ROMANTISMO E AO MODERNISMO]

Nelson Marzullo Tangerini

Manuel Antônio Álvares de Azevedo [* São Paulo, Província de SP, 12 de setembro de 1831 – + Rio de Janeiro, capital do Império] foi um poeta da 2ª geração romântica, chamada pelos estudiosos de literatura como ultrarromântica ou byroniana, ou ainda, geração do Mal do Século. Dramaturgo, poeta e ensaísta brasileiro, Álvares de Azevedo, morreu aos 20 anos, de câncer, após queda de um cavalo na cidade fluminense de Itaboraí. deixando obras como Noite na taverna, Lira dos vinte anos, Poesias e o poema inédito O conde lopo.

Nestor Tambourindeguy Tangerini, [*Piracicaba, SP, 23 de julho de 1895 - + 30 de Janeiro, GB), também poeta, e paulista como Álvares de Azevedo, escrevia sonetos líricos e satíricos, respeitando a forma parnasiana, que primava pelos decassílabos e alexandrinos perfeitos, odiava o sentimentalismo e cultuava as mitologias grega e latina. Um dos poetas “parisienses”, do Café Paris, Niterói, RJ, anos 1920, Tangerini fazia parte da 2ª geração parnasiana, ainda não estudada - e relegada ao porão por críticos literários e professores de literatura, que se deixaram contaminar pelo advento da Semana de Arte Moderna de 1922.

Na revista de humor e sátira O Espeto, onde publicava suas caricaturas cubistas, esquetes, trovas, crônicas e sonetos com inúmeros pseudônimos, faz uma dura críticas ao românticos [herança da escola Parnasiana] e parodia Álvares de Azevedo, com uma caricatura que leva uma legenda demolidora.

Antes, porém, publicamos aqui o poema “Se eu morresse amanhã”, de seu conterrâneo:

“Se eu morresse amanhã, viria ao menos

Fechar meus olhos minha triste irmã;

Minha mãe de saudades morreria

Se eu morresse amanhã!

Quanta glória pressinto em meu futuro!

Que aurora de porvir e que amanhã!

Eu perdera chorando essas coroas

Se eu morresse amanhã!

Que sol! que céu azul! que doce n'alva

Acorda a natureza mais louçã!

Não me batera tanto amor no peito

Se eu morresse amanhã!

Mas essa dor da vida que devora

A ânsia de glória, o doloroso afã...

A dor no peito emudecera ao menos

Se eu morresse amanhã!"

A referida caricatura, de 1947, mostra um casal deitado na grama de algum parque da cidade, trocando juras de amor.

Diz o rapaz para a moça:

“ - Se eu morresse amanhã, querida, tu chorarias?”

A moça lhe responde com simplicidade:

“- Que pergunta! Então você não sabe que choro à toa!”

Por coincidência, o paulista Nestor Tangerini também morreu de câncer [no pulmão, mas aos 71 anos], no Rio de Janeiro, como o grande Álvares de Azevedo.

Em poesia, com um soneto satírico, Nestor Tangerini alfineta, também, um poeta pseudo-simbolista e os modernistas [ou futuristas, primeiro nome do movimento] - de 1922.

Para o pseudo-simbolista, este:

“ESTAVA ESCRITO...

‘Certo poeta, que se julga

um segundo Cruz e Sousa,

anunciou haver perdido os

originais de seu livro de versos,

prometido para breve’.

(Dos jornais)

Li, nos jornais, uma notícia triste...

Após ter produzido obra de truz,

os seus versos perdeu... (Ninguém resiste!)

o conhecido vate Souza Cruz...

Espremer a caixola de lemiste,

que lhe abriga as idéias contra a Luz,

e o prêmio, finalmente, esse consiste

em ver-se o poeta exposto aos urubus...

Coisa dura! Tão dura, que somente

quem na recebe é que de fato a sente

e sabe onde lhe dói, ó Prometeu!

Baldado esforço! A perda de tal fruto,

as nossas letras hão de estar de luto...

- Que tesouro de asneiras se perdeu!...

Há uma outra versão do poeta, após publicação no jornal O FLUMINENSE, Niterói, RJ, terça-feira, l6/07/1929, com o pseudônimo “João da Ponte”. No 2o verso, 1o quarteto, ficaria: /Espremer a cabeça de lemiste,/, enquanto que, no l º verso, 2o terceto, ficaria: /Lamentável perda de tal fruto/.

E este, para os modernistas:

“MISS PROGRESSO

Declama, escreve, toca, pinta e canta,

dentro, porém, da escola futurista;

freqüenta os clubes, onde pinta a manta,

e é mais farrista que qualquer farrista.

Corre a cavalo, e é mais paraquedista

do que o Tenente Chevallier, que espanta;

na qualidade de automobilista,

a quem lhe vai à pista ela suplanta.

Joga sinuca, futebol, e nada

qual nadar não conseguem, na baía,

os peixes, que ela deixa na rabada.

Alma de arranha-céu, ou Corcovado,

é tão pelo progresso, que, hoje em dia,

adora um Cristo de cimento armado... “

O mesmo aconteceu com Miss Progresso, escrito em Campos, RJ, em 1928, e, futuramente, publicado no jornal ENTRE AMIGOS Especial – Para a eternidade -Nestor Tangerini – Ano I – No. 3 - pág. 2 – Editor Vilnei Kohls - Porto Alegre, RS, maio/junho – 1999: este soneto teve uma outra versão, conforme anotações do poeta: no 4o verso, 2o quarteto, ficariam: /”a quem for à pista ela suplanta”/.

Os sonetos de Nestor Tangerini, publicados nesta crônica, fazem parte do livro Humoradas..., da Editora Autografia, Rio de Janeiro, RJ, 2016.

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 28/04/2020
Reeditado em 28/04/2020
Código do texto: T6931022
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