Crônica do valente despertar
Abri os olhos e me espreguicei.
- Que soninho bom! Que horas são?
- Sete horas.
- Da noite, já? Dormi bastante.
- Não, da manhã. É domingo.
- Domingo!? Bah, então não é entardecer, mas amanhecer.
- Sim, deixei-te dormir, parecias tão cansado, um cansaço vindo de esferas profundas.
- Esferas profundas? Porque de esferas profundas e não de recônditos singulares da alma?
- Retornou cheio e perguntas e contestações. Por onde andou durante todas essas horas?
- Por saraus literários, adorando literatos que admiro, acho até que um deles era Chico Buarque, encantado e compassivo com meu apego e guarda a seus textos. Acho que exagerei na comida e na bebida, pois acordei um pouco enfarado.
- Exagerou no pão comum. Tomou os remédios da diabetes, antes de sestear, ou melhor, de te atirar no infinito das esferas ou recônditos?
- Tomei... Acho que sim. Tomei sim. Ou não? Não sei. Faz tanto tempo, já...
- Viste? O que tu comeu lá nos recônditos singulares das esferas profundas, enquanto apreciava crônicas e romances...
- Não, não, eram poesias apenas, nos saraus. Escritas em papel datilografado. Eram saraus às antigas, poetas mediados pela datilografia que, lembro, sempre dava um ar de autoridade ao poema. Poema datilografado é como homem feito, já pode enfrentar o mundo!
- Ok, enfrentemos o mundo tal qual poemas datilografados. Quem faz o café? Tu ou eu?
- Estou enfarado, já disse.
- Tá ok, então. Tu faz e me traz ele aqui, tá bom?
- Eu?
- Sim, cadê tua coragem de poema datilografado, de homem feito encarando valentemente saraus pelos recônditos singulares de tua alma? Levanta e vai, oras! Que, no meu caso - vinda do vazio de minhas esferas -, a fome urge.
- Tá bom, tá bom. O que tu quer comer e beber?
- Improvises, adivinhes, "criatives" - como Mia Couto diria.
- Ele estava por lá, sabias?
- "Soninho" "abensonhado" esse, então. Vai, vai, estou com fome. Inventes e aumentes.
- Nelson Rubens reprocessado, pela manhã?
- Tens preconceito, é? Ou ficou bobo por ter com o Chico e o Mia nos saraus? VAI!
- Tá, tá, tá, tô indo.
Obediente, levantei e fui, valente, fazer o café da Louise. Não preciso criativar ou inventar: depois de tanto tempo, já sei do que ela gosta. Mas vou aumentar. Aquilo foi uma direta, ela nunca, antes, usara Nelson Rubens pela manhã. A fome deve ser imensa. Ai, porque esse enfaro?
Bom dia, meus caros 23 fiéis leitores e demais 23 que de quando em vez passam por meu quarto literário para ver se esse Bacamarte já acordou a fim de preparar uma crônica matinal. Me deu fome, agora. Acho que vou fazer um café para mim também. E dormir um pouquinho mais, depois. Vai que encontro o Guimarães Rosa ou o Machado de Assis?
Fui. Inté.
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Era isso pessoal. Toda sexta, às 17h19min, estarei aqui no RL com uma nova crônica. Abraço a todos.
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(Não sei porque eu ainda coloco o link desse blog, eu perdi a senha e não atualizo ele há séculos. Até eu descobrir o motivo pelo qual continuo divulgando esse link, vou mantê-lo. Na dúvida, não ultrapasse, né. Acho que continuarei seguindo o conselho que a Giustina deu num comentário em 23 de outubro de 2013: "23/10/2013 00:18 - Giustina
Oi, Antônio! Como hoje não é mais aquele hoje, acredito que não estejas mais chateado... rsrrs! Quanto ao teu blog, sugiro que continues a divulgá-lo, afinal, numa dessas tu lembras tua senha... Grande abraço".).