Valor do velar
Com seus vinte e poucos mil habitantes na sede municipal - a que se somam mais outros poucos mil nos povoados - Pitangui mantém uma tradição quase secular: os anúncios fúnebres são invariavelmente feitos no alto falante da torre da matriz de Nossa Senhora do Pilar - ora, excepcionalmente suspensos em razão da pandemia do corona vírus - precedidos pela execução instrumental completa da música Il Silenzio. É tocante, sempre. E os ouvidos se aguçam nas janelas, nos quintais, nas varandas e nas ruas e praças para se identificar o de cujus.
Para variar, uma buzinada, ou o ruído ensurdecedor de uma motocicleta corta a sequência na hora mais solene. Mas há sempre uma repetição do anúncio e algum vizinho ou parente de ouvido mais acurado pode ser acionado com sucesso. Demais, não é apenas o nome de pia do de cujos que é mencionado na chamada ao velório e consequente enterramento.
Apelido, filiação, e profissão são proclamados quase que infalivelmente.
Embora tendo vivido nesta Velha Serrana por um período relatiavemente curto de minha existência, sete anos e meio, até completar meu curso ginasial, mantive e venho mantendo contato e convívio frequente com parentes de uma forma particular, e, de forma geral, com esta urbe e seu povo.
A ida as velórios é um corolário dessas ligações, sobretudo depois que o Velório Municipal foi erigido há umas poucas décadas, e facilitou as congregações, possibilitando, inclusive a realização simultânea, quando co-ocorre, dessa atividade de homenagem aos que partem e de condolências aos que ainda irão, como iremos todos...
Nas minhas idas, antes da definitiva, tenho sempre duas certeza: lá encontrarei o Zé Hélio e o Osvaldo, sempre atentos, obsequiosos, ciosos de seu dever cristão de confortar, e compungidos. Duas lições de que há compatibilidade entre o aqui e agora e o além, para quando chegar a hora.