Juntos separados, separados juntos: Tempos de pandemia covid19
Nos últimos tempos, muito se tem dito e observado: O aparelho de telefone celular se tornou uma unanimidade e um padrão necessário. Nas festas, jantares, barzinhos e rodas sociais, as pessoas reunidas por vezes estão ensimesmadas e ausentes com a atenção voltada para a pequena tela.
Certamente, isso não se aplica à totalidade da população, neste mundo de desigualdades sociais, as camadas sociais subjacentes aos milagres do mercado e do consumo não atingem com tanta intensidade esse mundo digital.
De tudo a tecnologia em questão não é deletéria, no primeiro parágrafo há apenas uma rápida especulação sobre o quanto o mundo digital, a rede de informações e as redes sociais interferem no comportamento das pessoas, nem tudo são flores e tão pouco espinhos, mas um pouco dos dois quando a questão é o avanço da ciência.
Sobre isso, é como pensou Nietzsche, em Zaratrusta: Da árvore e da montanha: “O que sucede à arvore sucede ao homem. Quanto mais se quer erguer para o alto e para a luz, mais vigorosamente enterra as suas raízes para baixo, para o tenebroso e profundo, para o mal"; aqui, metaforicamente, a árvore é a ciência.
Outro dia havia uma charge, num jornal, na qual a mãe manda o filho Joãozinho tomar banho pelo celular, sendo que ambos estão sentados no mesmo sofá...prontamente o menino responde também pelo celular.
A junção da internet com a rede de informações mundial (WWW) em aparelhos de comunicação remota e computadores, cada vez mais tecnológicos, conduz o homo sapiens a um novo patamar existencial; ainda que boa parte da humanidade esteja em situações pré-civilizatórias e lutando por migalhas para não morrer de fome e de sede.
Em contraposição os extratos superiores da pirâmide econômica são marcados por consumo patológico e individualismo, aqui o tempo é contado em moedas e velocidade é tudo.
Neste mundo contemporâneo, onde o tempo é monetizado, o espaço foi engolido pela informação e a velocidade com que os conteúdos transitam de um lado para o outro tem peso de ouro. A velocidade é cada vez maior e distâncias enormes são vencidas sem que se saia do lugar, pois o meio é a própria mensagem, como disse Marshall McLuhan.
O tempo é outro, em um passado não tão longínquo a comunicação era feita por cartas escritas à caneta de pena. A mensagem seguia no lombo de burros ou a bordo de caravelas. Desta forma o anuncio da morte de alguém só chegava ao destino bem depois da missa de sétimo dia.
Canetas de pena recolhidas aos museus, nos dias atuais a World Wide Web disponibiliza tudo ao mesmo tempo agora. As informações correm como ondas turbulentas num mar sem fim. Neste mar, cada celular é um barco com um único navegante.
Todos querem estar conectados, todos querem saber, todos querem teclar, em meio ao conteúdo as distâncias do mundo se estreitam no mesmo ritmo em que a proximidade entre as pessoas é anulada pela virtualidade. Na web fecham-se negócios, leem-se jornais, pagam-se as contas; se conversa com gente do mundo todo, etc. O mundo ao alcance dos polegares e indicadores e a mente absorvida por um mundo imaterial.
Assim, o local de encontro entre as pessoas digitais está restrito à virtualidade. O mundo é a mensagem por si só! É incrível como a força que aproxima as pessoas virtualmente é a mesma que as afasta.
Agora, em tempos de pandemia, o meio digital se apresenta ainda mais como alternativa para a manutenção do status quo, o fatídico isolamento social, por questão epidemiológica, coloca barreiras físicas entre as pessoas, paredes se impõem como fronteira e máscaras no rosto remetem a um uníssono baile de desconexão material.
Agora, o modelo home office é a alternativa apresentada pelo sistema social, toda a sorte de atividade humana devidamente realizado à distância. Contraditoriamente, aquilo que fomentava o isolamento entre pessoas fisicamente próximas, se tornou alternativa para maior aproximação, ainda que virtual.
Há que se destacar que atualmente 850 milhões de crianças estão sem ir à escola por causa da pandemia, em São Paulo não é diferente. Sim, o mundo digital se apresenta positivamente como alternativa momentânea para que essas crianças não fiquem sem aula. Mas devido às desigualdades social e econômica, boa parte da humanidade não está inserida no tal mundo digital. Em São Paulo, por exemplo, dados oficiais dão conta de que 40% das crianças matriculadas nas escolas públicas não têm acesso á internet.
Quanto ao acesso democrático e irrestrito ao mundo digital, há correções a serem feitas, mas, de qualquer forma, quando a fatídica pandemia passar o mundo certamente será outro. A distância física pelo isolamento social não se imporá mais, porém as pessoas possivelmente estarão ainda mais distantes entre si e o mundo virtual estará ainda mais consolidado.