DIREITO AO CHORO! POR FAVOR!

Bem, sempre acreditei que qualquer ser humano tem o direito de chorar, chorar é lavar o corpo de dentro para fora, é chegar ao limite do que se sente e transcender, redescobrindo-se de um jeito completamente insuspeitado. Choro com poemas, músicas, trechos de livros, um dia desses chorei com um artigo científico que estava a ler. Porém, a questão toda não é essa.... e é também.

Tenho um amigo que detesta o tragicômico – eu me acho super ultra tragicômico, e gosto, gosto desse jeito meio cores de Almodóvar – certa vez, em que conversávamos sobre músicas, ele me falou que não gostava de música de bad, música triste que levasse alguém ao choro. Eu fiquei com aquilo na cabeça durante dias. Pensava: Como o chorar é entendido por fulano? Como as pessoas entendem o choro ou mesmo a bad?

O problema é que entendo o choro, a bad, a tristeza, de um jeito diferente. Por exemplo, tem uma música da Letrux que diz assim: “Remédio, terapia e naufragar”. E tatuei essa frase, tanto pelo momento em que me encontrava, como pela poética da frase. Então, um dia voltei a questionar esse meu amigo sobre a música, a bad, o choro e tudo mais.

Ele respondeu que não via sentido nisso. Aí, eu parei e disse: Mas, olha você está escutando "20 Anos Blues", de Elis Regina, tem música mais triste e pesada como essa? Fala sobre o passar do tempo, das respostas que nunca chegam com a idade, das perguntas que se acumulam na existência de qualquer ser. Ele falou que não, que não via isso na música.

Então, fui mais fundo e disse: olha quando eu falo de choro, de bad, de tristeza, de mergulhar para dentro e se olhar, não estou dizendo que você tem que se tornar uma pessoa depressiva ou deprimida, mas que existe algo bonito no choro, na emoção de uma canção, na leitura de um poema, eu, por exemplo, passo dias lendo “A vida bate”, de Gullar, e acho um poema triste, mas cheio de esperança. Creio que o choro é nossa forma de falar com as lágrimas o que a poesia já não dá mais conta. Pois, chega um momento em que o poema, a vida, a existência já não se dão por palavras, mas por sentir. E o sentir pode surgir em qualquer ponto da cidade, da rua, da casa.

Eu vejo o choro, o sentir, a música, a poesia e a tristeza como alicerces desse edifício chamado humano. Eu choro não só por me encontrar olhando a caixa de ansiolítico ao meu lado, mas pela beleza que sinto ao ouvir as “Lágrimas Negras”, de Gal, ou o “Banho de Mar”, de Letrux, ou mesmo “Canção de Engate”, com Catto.

Eu estou bem, mas quero o direito ao choro em todas as minhas emoções contidas. Eu quero o prazer de chorar e me sentir como um cavalo novo, como um sol nascendo na calmaria da praia, e quero transformar minha solidão em força, mesmo que isso me fulmine, porém, terei vivido, amado, chorado, terei a precisão da minha existência.

Jailson Anderson
Enviado por Jailson Anderson em 15/04/2020
Reeditado em 24/07/2020
Código do texto: T6918325
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