POR ISSO TEMOS BRAÇOS LONGOS...

Que me perdoem os marombeiros, mas acho academia o lugar mais entediante do mundo, é claro que não se pode negar que a prática de atividade física é essencial para manter a saúde; o sedentarismo já é considerado a doença do século e por mais que os impostos estejam um absurdo e a vida não seja fácil, ninguém quer perdê-la em um infarto agudo do miocárdio, seja em que idade for. Agora, superar a nociva lei do menor esforço é o grande desafio de nossa geração.

Particularmente opto pela caminhada, é uma ótima atividade, sobretudo porque não há um objetivo aparente, pelo menos não fico me autoflagelando com essas metas de ter que andar tantos quilômetros, ou durante tantos minutos, isso tira o prazer da prática, tampouco há uma disputa, uns caminham mais lentamente, outros mais apressadamente, mas não é o ritmo que determinada a qualidade da caminhada e sim a sensação de bem-estar que ela proporciona.

Foi numa dessas caminhadas que vi um casal, pareciam ser turistas, pelo menos tinham feitio de turistas. Olhavam o horizonte com olhos curiosos, olhos de criança, trocavam as carícias de quem está de passagem, tinham a paisagem dentro de si. Bem poderiam ser um casal desses comerciais de margarina ou sabão em pó, aquela família perfeita à mesa no café da manhã. “Me passa o cereal, é claro, amor!” Essas coisas...

O fato é que quando me aproximei, percebi que tentavam tirar uma fotografia, contorciam-se no intuito de se enquadrem, em um instante pensei que a moça se desequilibrara na tentativa de registrar o terno momento. Não me contive e me ofereci para realizar tal tarefa. Afinal, todos já passamos por situações semelhantes e uma mínima caridade é sempre bem-vinda. Mas tal foi minha surpresa, a recusa instantânea e convicta da dupla, seguida de um polido esclarecimento “É que queremos tirar self”.

Em que momento o formato se tornou mais importante que o conteúdo, e o modismo superficial virou estética? Fico me questionando, depois que me despedi do casal com um aceno de cabeça. Talvez busquemos mais autoria, aquele orgulho bobo em dizer “eu que fiz, eu que tirei...” Por dois séculos necessitamos de alguém que dissesse “mais pra cá, mais pra lá, olha o passarinho...”. Agora a libertação, a autonomia para captarmos os momentos, mesmo banais. Pra ser sincero, acho que a self é uma espécie de masturbação do ego. Vinicius de Moraes, em um de seus poemas que mais aprecio, escreveu “por isso temos braços longos para os adeuses” hoje a coisa seria mais ou menos: por isso temos braços longos para as selfies...